Maurício Antônio Lopes — Pesquisador da Embrapa Agroenergia
Os computadores que usamos hoje funcionam de maneira simples: toda informação é armazenada como uma sequência de sinais que podem estar ligados (1) ou desligados (0), como um interruptor de uma lâmpada. Essas unidades básicas, chamadas bits, são os blocos fundamentais da computação. Assim como várias lâmpadas acesas e apagadas podem formar imagens em uma tela, bilhões de bits combinados permitem que computadores executem cálculos, analisem dados e resolvam problemas complexos. Esse sistema permitiu avanços como a internet, smartphones, inteligência artificial, até a exploração espacial.
Agora, imagine que uma lâmpada não precise estar apenas acesa (1) ou apagada (0), mas possa estar nos dois estados ao mesmo tempo. No mundo comum, isso parece impossível, mas, na física quântica, partículas podem existir simultaneamente em múltiplos estados. A computação quântica aproveita esse fenômeno por meio dos qubits, a versão quântica dos bits, que podem representar 0 e 1 ao mesmo tempo. Isso permite que, em vez de testar um caminho de cada vez, como fazem os computadores tradicionais, um computador quântico pode explorar múltiplas possibilidades ao mesmo tempo.
Esse salto revolucionário pode acelerar a solução de problemas incrivelmente complexos. Por exemplo, imagine o desafio de encontrar a senha correta para destrancar um cofre com milhões de combinações. Um computador tradicional tentaria cada senha até achar a certa, o que pode levar muito tempo. Já um computador quântico pode testar múltiplas combinações possíveis de uma vez, encontrando a resposta de forma muito mais rápida.
A computação quântica representa um avanço transformador porque permite resolver problemas que, com os computadores tradicionais, levariam séculos ou até milênios. Isso tem impacto direto em diversas áreas críticas para a sociedade. Na saúde, pode acelerar a descoberta de novos medicamentos e tratamentos personalizados. Na energia, pode ajudar a desenvolver baterias e materiais mais eficientes. Na segurança digital, pode criar sistemas de criptografia mais avançados e protegidos.
E não estamos falando de um conceito distante ou futurista — assim como a inteligência artificial (IA), essa revolução já está em curso e promete transformar o mundo da ciência e da tecnologia muito antes do que imaginamos. A convergência entre essas duas forças abre possibilidades inusitadas, permitindo que algoritmos de IA se tornem mais rápidos, precisos e adaptáveis. Com sua capacidade de processar múltiplos cenários simultaneamente, a computação quântica viabiliza modelos preditivos mais sofisticados e a resolução rápida de problemas complexos que hoje exigem enormes quantidades de dados e tempo de processamento.
Pensemos no impacto dessa convergência para áreas essenciais à sobrevivência humana, como agricultura e alimentação. Sistemas avançados poderão analisar milhões de variáveis climáticas em segundos, prevendo colheitas, antecipando secas e pragas e otimizando o uso de insumos. Plantas e animais mais produtivos e resilientes poderão ser desenvolvidos em tempo recorde, simulando digitalmente milhares de combinações genéticas antes mesmo de chegarem ao campo.
Cadeias de suprimentos poderão ser otimizadas para reduzir desperdícios e aumentar a eficiência na distribuição de alimentos. Novos componentes e produtos alimentares poderão ser modelados para minimizar impactos sobre os recursos naturais. Em um mundo marcado pela crise climática, essa revolução pode nos permitir produzir mais com menos impacto, garantindo um futuro em que ninguém precise escolher entre a produção de alimentos e a preservação ambiental.
Essas transformações dependerão da velocidade e da forma como essas tecnologias serão integradas às nossas realidades produtivas, políticas e sociais. Computação quântica e IA são um salto sem precedentes para enfrentar desafios em todos os setores, mas sua adoção exige infraestrutura adequada, profissionais qualificados, a adaptação de modelos de produção e a regulação necessária para garantir seu impacto positivo na sociedade.
É essencial garantir que essas inovações sejam acessíveis, evitando desigualdades e concentração de poder. Para isso, é fundamental um esforço coordenado para democratizar o acesso e incentivar aplicações estratégicas dessas tecnologias. O Brasil, com sua riqueza de talentos e recursos, precisa agir agora para não se limitar a consumir soluções desenvolvidas por outros, mas, sim, assumir um papel de protagonismo nessa nova era.
O momento de agir é agora. Para não ficarmos para trás, é essencial investir de forma imediata e estratégica em pesquisa, capacitação e políticas públicas que impulsionem a inovação. Essa corrida tecnológica não é apenas sobre competitividade, mas sobre soberania e futuro. As escolhas que fizermos hoje determinarão nosso papel no cenário global amanhã — e, diante dessa revolução, a inércia simplesmente não é uma opção.
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