
Tamires Borges*
As mulheres negras estão entre os piores índices no que diz respeito a tecnologia e inovação no Brasil, atualmente. A PretaLab — plataforma de mapeamento de mulheres negras e indígenas na tecnologia — em sua última pesquisa, constatou que de 1.427 profissionais da área: 69% são de pessoas autodeclaradas pretas e 21%, são pardas. No mesmo estudo, os dados revelam que 11% das mulheres negras no Brasil trabalham em empresas de tecnologia e apenas 3% das mulheres negras estão matriculadas em cursos de pós-graduação na área de tecnologia.
A pesquisa demonstra que as mulheres negras enfrentam grandes desafios para se inserir e permanecer no mercado de trabalho de tecnologia e lidam, por exemplo, com a sub-representação em cursos da área, falta de diversidade de gênero e discriminação de gênero, de sexualidade, classe social, xenofobia e raça. É nítido que o acesso das mulheres negras ao mercado de tecnologia é mínimo, o que dificulta e impossibilita a criação de invenções por mulheres negras.
É importante mencionar que quando as mulheres negras têm a oportunidade construir invenções, elas conseguem atingir resultados inimagináveis e que contribuem bastante para a nossa sociedade, como tivemos a honra de presenciar. Entre as diversas mulheres negras que contribuíram com o avanço da nossa tecnologia, com invenções incríveis e que deixaram um legado para a ciência e para a sociedade, podemos mencionar Shirley Ann Jackson, que, além de ser a primeira mulher negra a conquistar seu Phd, foi a responsável pelo desenvolvimento de uma pesquisa que deu origem às telecomunicações. E a partir das descobertas da pesquisadora o fax portátil, o telefone de toques e cabos de fibra óptica puderam ser criados.
Outra contribuição bastante considerável para a sociedade foi a tecnologia 3D, criada por Valerie Thomas, física e analista de dados da Nasa. Ela inventou o aparelho transmissor de ilusão, um dispositivo que cria, transmite e recebe imagens em três dimensões (3D) de um objeto em tempo real. Essa é uma tecnologia, hoje, utilizada tanto na agência espacial, quanto em salas cirúrgicas, no desenvolvimento de aparelhos de televisão e nos cinemas, por exemplo.
O tubo de alimentação que fornece pequenas porções de comida a um paciente em seu próprio ritmo, permitindo que o enfermo morda o tubo para solicitar outra porção, é utilizado hoje em hospitais. Ele foi criado pela fisioterapeuta Bessie Blount Griffin. Outra prova de que uma mulher negra pode, sim, inventar algo para benefício de toda a humanidade.
Falando novamente de Shirley Jackson, pesquisadora, primeira negra a obter um doutorado no Massachusetts Institute of Technology (MIT), foi a criadora do identificador de chamadas, uma invenção que possibilita receber ligações e poder avaliar se rejeitamos. Incrível, não é?
Esses legados comprovam que, quando as mulheres negras conquistam oportunidade de ascender na área da tecnologia, elas mostram que têm potencial e impulsionam ainda mais as criações no Brasil. Como diz a professora de estudos afro-americanos da Universidade de Princeton, Ruha Benjamin, ao afirmar: "Nós não queremos consertar um sistema quebrado, queremos reimaginar completamente o sistema. E quando eu digo reimaginar, estou falando de forma literal, empregando ferramentas criativas para irmos contra o status quo sexista e racista".
Precisamos de mudanças que possibilitem as mulheres pretas produzirem invenções tão importantes quanto as que temos hoje, cujas autoras nem sequer tivemos a oportunidade de nominar neste artigo. Elas merecem ser conhecidas como as criadoras de escova de cabelo, babyliss, GIFs, tratamento de catarata, tábua de passar roupa, aquecedor central, entre outros mais que, muitas vezes, nem sabemos. Esse apagamento pode acontecer pelo fato de um homem ter levado os créditos ou por causa do machismo e do sexismo que ainda estão embutidos em nossa sociedade.
Assim, não podemos deixar que as mulheres negras sejam limitadas em suas trajetórias e potenciais, mas, sim, incentivar e possibilitar que tenham meios para produzir suas invenções. É necessário que sejam empregadas ferramentas criativas para que possam ir contra as discriminações sexista e racista, além de aparatos, como políticas públicas e privadas, que possam ensejar tais oportunidades. Hoje, o nosso objetivo é que mais mulheres negras possam tanto assumir mais espaços de liderança na área de tecnologia, quanto em outros grupos e equipes de tecnologia e inovação. O mundo tem muito a ganhar!
*Advogada e secretária-geral da Associação Obinrin Badu