José Manuel Diogo*
Embora também haja imensa gratidão pelos craques da bola em língua portuguesa — que, como Vinicius ou Cristiano Ronaldo, projetam Brasil e Portugal ao redor do mundo —, a conquista de Fernanda Torres é de natureza maior. Se no futebol a bola desliza pelo gramado unindo multidões, no Globo de Ouro a "bola" em jogo foi a própria língua que sustentou uma atuação, venceu barreiras e arrebatou aplausos.
Não se trata de um talento qualquer que, por acaso, fala português; é alguém que conquistou o mundo justamente falando em português, levando nosso idioma ao centro do palco. É como se, desta vez, o troféu não fosse apenas um prêmio pessoal, mas a coroação da nossa voz em toda a sua riqueza e diversidade.
Ao erguer o Globo de Ouro, Fernanda Torres fez mais do que brilhar: ela projetou uma língua que conecta milhões de pessoas em vários continentes, unindo lugares distintos, de Lisboa a Luanda, do Rio de Janeiro a Maputo. Cada palavra do discurso premiado reverberou como um apelo. Um triunfo que ilumina um aspecto muitas vezes subestimado: o imenso valor econômico que habita a nossa língua. A vitória vai atrair novos investimentos, despertar o interesse internacional e legitimar o português como um idioma de impacto global.
A economia da língua portuguesa se estende por diversos setores, como a literatura, a música, o turismo, a tecnologia e o audiovisual. No campo editorial, livros de autores consagrados, como Machado de Assis, ou modernos, como Mia Couto, continuam a seduzir leitores de todo o mundo, gerando traduções, vendas e intercâmbios culturais. No audiovisual, cada produção em português que chega às plataformas de streaming carrega histórias genuínas e autênticas, atraindo investimentos estrangeiros e ampliando oportunidades de emprego. Guimarães Rosa já dizia que "o real não está na saída nem na chegada, mas na travessia"; cada travessia lusófona, seja em filmes ou séries, comprova a força de nossas narrativas para fascinar públicos globais.
A música também evidencia esse potencial. Shows de artistas em português, como Anitta e Caetano Veloso, lotam arenas no exterior, disseminando ritmos que geram receitas e promovem o intercâmbio cultural. Turistas sedentos por conhecer a terra que inspirou aquelas canções acabam movimentando hotéis, restaurantes e serviços, fortalecendo as economias locais. Da mesma forma, no turismo de língua portuguesa, brasileiros sentem-se acolhidos em Portugal e vice-versa, enquanto outros países lusófonos despertam o interesse de viajantes que desejam explorar suas belezas e costumes. A língua funciona como uma espécie de "passaporte" que facilita negócios e aproxima nações.
O avanço empresarial em português não fica atrás. Gigantes como Banco Inter, PagSeguro e Vila mostram que é possível inovar e atrair investidores internacionais, fazendo do idioma um diferencial de comunicação. Empresas lusófonas se beneficiam da afinidade linguística ao expandir serviços e soluções, já que compartilhar uma língua comum simplifica negociações e estimula parcerias.
A educação, por sua vez, reforça essa dinâmica. Universidades do Brasil e Portugal, como o IDP, a USP, a Universidade de Coimbra e da Beira Interior, bem como de países africanos de língua portuguesa, atraem estudantes estrangeiros e desenvolvem pesquisa de ponta, gerando arte, patentes e tecnologias. A troca de conhecimento em português fortalece a cooperação acadêmica, amplia a mão de obra bilíngue e une instituições em torno de projetos internacionais. Essa rede alimenta a inovação, consolida o valor da língua e beneficia toda a comunidade lusófona.
O triunfo de Fernanda Torres no Globo de Ouro espelha também o vigor de um idioma que não se define apenas pelo número de falantes, mas pela capacidade de encantar e negociar espaços. Ao atuar em português e triunfar em um prêmio de renome mundial, Fernanda personificou a potência cultural e econômica que carregamos na ponta da língua de José Saramago, ou não fôssemos todos "feitos de histórias", como falava Saramago.
A noite bela de Fernanda representa algo maior: um idioma que avança nos grandes palcos do mundo, abrindo portas em setores diversos e semeando oportunidades de desenvolvimento. Talvez, até agora já possa ser, como desejam os políticos de Portugal e do Brasil, língua oficial das Nações Unidas.
Foi a língua que subiu ao palco — e nela se encontram a criatividade, a força econômica, o orgulho e os sonhos de todos os que a falam. Obrigado, Fernanda.
*Escritor, cronista, consultor internacional e produtor cultural
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