Em 8 de dezembro de 1941, o então presidente Franklin Roosevelt proferiu aquele que ficou conhecido como o "Discurso da Infâmia", em uma sessão conjunta do Capitólio. Vinte e quatro horas antes, o Japão atacara as bases militares norte-americanas em Pearl Harbor, no Havaí, e nas Filipinas — em declaração de guerra aos Estados Unidos e ao Império Britânico. Em 8 de janeiro de 2023, uma horda de radicalizados, mobilizada por agitadores profissionais, invadiu e depredou as sedes dos Três Poderes, declarando guerra à democracia brasileira.
Naquele domingo, na redação deste Correio Braziliense, os jornalistas se reuniram entre aturdidos com o vandalismo e desconfiados de que o ataque não era gesto isolado de extremismo político. A única certeza que tinham era de que estavam diante de um momento tristemente histórico. Aos poucos, foi ficando claro que aqueles ensandecidos eram parte de uma sequência programada de agressões e tumultos que vinha desde o segundo turno da eleição presidencial, em outubro de 2022.
A fileira de eventos mostrava o Estado Democrático de Direito em perigo. Na data do segundo turno, eleitores do Nordeste tiveram o direito ao voto prejudicado por blitze da Polícia Rodoviária Federal (PRF). Decretado o resultado, estradas pelo país foram bloqueadas por indivíduos inconformados com o que as urnas eletrônicas trouxeram. Em 12 de dezembro de 2022, data da diplomação do presidente eleito, um quebra-quebra assustou Brasília, com veículos incendiados e tentativa de invasão da sede da Polícia Federal (PF). Na véspera do Natal, houve a frustrada explosão de uma bomba, colocada em um caminhão-tanque estacionado próximo ao aeroporto da capital. Somam-se ainda multidões nas portas dos quartéis do Exército, pedindo intervenção militar com discursos, faixas e cartazes.
A PF ligou os pontos. A reação da Justiça veio na medida da extensão da ameaça: prisões e condenações a altas penas por solaparem a democracia com métodos violentos. E mais: militares de alta patente estão presos por arquitetarem o golpe; personagens da política estão intranquilos em relação ao futuro; e tenta-se levar adiante, no Congresso, uma desonrosa anistia, em clara afronta ao Judiciário e à decência.
Na próxima quarta-feira, nosso "Dia da Infâmia" completa dois anos. Seu significado está muito acima de qualquer discurso. Os democratas, independentemente da corrente política, se lembrarão da data com consternação. Já aqueles que insistem na risível falácia de que foi uma "revolta popular" precisam ser observados cada vez mais de perto.