O Censo 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelou que 914.746 indígenas — 53,97% do total no país — residem em áreas urbanas, um aumento de 181,6% na comparação com 2010, quando apenas 324.834 estavam nas cidades. O recenseamento identificou 8.568 localidades indígenas, distribuídas em todos os estados e no Distrito Federal. Ou seja, lugares onde vivem 15 ou mais indígenas, em áreas urbanas ou rurais, dentro ou fora de terras indígenas, entendidas como aldeias, comunidades, sítios, acampamentos e instituições de acolhimento. A maioria das localidades (72%) está em terras indígenas declaradas, homologadas, regularizadas ou encaminhadas como reservas indígenas.
A Região Norte abriga a maior parcela de população do país (753.480 ou 44,47%) e o maior número de localidades identificadas (5.158 ou 60,20%). Na sequência, estão o Nordeste, com 1.764 localidades (20,59%); o Centro-Oeste, com 1.102 (12,86%); o Sul, com 308 (3,59%); e o Sudeste, com 236 (2,75%).
Os povos originários estão em todos os estados do país. Diferentemente de sondagens anteriores, o Censo de 2022 trouxe mais detalhes sobre a realidade dessa camada da sociedade. Desta vez, o IBGE mergulhou na pesquisa e constatou que 1,7 milhão de pessoas são indígenas autodeclaradas — 0,83% população brasileira. Na comparação com o Censo de 2010, em que o número de indígenas era 896.817 (0,47% dos brasileiros), houve um crescimento de 88,96% nos últimos 12 anos.
Essa parcela da sociedade brasileira é formada por 305 etnias e 274 línguas, conforme constatou o Censo de 2010. Os dados revelam que o Brasil tem uma enorme diversidade cultural, nem sempre reconhecida pelos não indígenas. Tamanha riqueza, incorporada nas tradições, não é vista como contribuição dos povos originários às singularidades regionais.
Os números não negam a capacidade de resiliência desses povos. A população indígena aumenta. Muitas comunidades seguem sendo perseguidas pelas terras que ocupam. Seus territórios são cobiçados por empresas privadas, agronegócio, mineradoras e até por grupos criminosos. Alguns são deslocados das áreas originárias para dar espaço a empreendimentos públicos com questionáveis retornos à sociedade.
No passado, alguns líderes indígenas que conheci diziam que deixar a aldeia e ir para a cidade tinha o objetivo de entender os "códigos" dos brancos e, dessa forma, encontrar meios de defesa para seus povos, vítimas da ganância dos que queriam expulsá-los de seus territórios. O objetivo persiste. Trocar a aldeia pelo meio rural, ou por um espaço nos centros urbanos, facilita o acesso à educação e à saúde, mas não suprime deles valores aprendidos com seus antepassados.
O Censo 2022 revela que o analfabetismo na população indígena diminuiu em todas as áreas. Entre 2010 e 2022, a queda foi de 23,40% para 15,05%; entre os indígenas em áreas rurais, passou de 32,16% para 20,80%; e, para os que vivem nas áreas urbanas, o recuo foi de 12,29% para 10,86%.
A luta em defesa da vida tem sido mais árdua devido aos muitos artifícios construídos pelos não indígenas. Em 2023, as cenas da tragédia Yanomami, protagonizadas por garimpeiros, patrocinados pelo crime organizado, ganharam destaque mundial. O avanço na demarcação dos territórios indígenas, uma exigência da Constituição de 1988, ainda é muito lento no país. Barreiras desrespeitosas impedem o reconhecimento da importância desses povos para o Brasil. Não reconhecer os direitos constitucionais dos povos originários é amputar a história e eliminar seres humanos que, dentro ou fora das florestas, têm saberes que contribuem para o bem-estar de toda a sociedade.
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