Opinião

O lixo eletrônico no mundo: estamos devagar na busca de soluções

No Brasil, menos de 3% dos resíduos eletrônicos são reciclados de forma adequada. A falta de infraestrutura para coleta e reciclagem é um dos principais entraves

Opiniao 2612 -  (crédito: Maurenilson)
Opiniao 2612 - (crédito: Maurenilson)

Samuel de Jesus Monteiro de Barros*

Em um mundo em que a tecnologia evolui rapidamente, a reciclagem de materiais eletrônicos tornou-se um dos pilares fundamentais da sustentabilidade. O crescente consumo de dispositivos eletrônicos elevou a produção de lixo eletrônico a patamares alarmantes. Segundo o Monitor Global de Lixo Eletrônico, da Organização das Nações Unidas (ONU), em 2023, mais de 62 milhões de toneladas de resíduos eletrônicos foram geradas mundialmente, com apenas 22,3% sendo reciclados de forma adequada. Esse cenário representa uma grave crise ambiental, mas também uma oportunidade para nações, empresas e sociedades redefinirem suas práticas.

A reciclagem de eletrônicos oferece vantagens econômicas e ambientais significativas. Países que implementam sistemas de reciclagem eficientes podem colher resultados financeiros expressivos. No Brasil, o governo projeta que a reciclagem de resíduos eletroeletrônicos possa gerar cerca de 10 mil empregos e adicionar mais de R$ 700 milhões à economia. Além disso, a recuperação de materiais valiosos, como ouro, prata e cobre, diminui a dependência de recursos naturais, aliviando a pressão sobre o meio ambiente.

O impacto global também é expressivo. De acordo com a Agência Europeia do Ambiente (AEA), a reciclagem eficiente de resíduos eletrônicos poderia gerar uma economia global de cerca de 55 bilhões de euros por ano. Esses recursos poderiam ser direcionados para o desenvolvimento de tecnologias sustentáveis e para a criação de vagas de trabalho, promovendo um ciclo econômico virtuoso.

Para as empresas, a sustentabilidade deveria ser mais do que uma questão ética; mas uma estratégia de negócios inteligente. O aumento da consciência ambiental entre consumidores, especialmente os de maior poder aquisitivo, tem levado corporações como Samsung e Apple a adotarem práticas de logística reversa. Isso não apenas melhora a imagem corporativa, mas também gera economias ao reaproveitar materiais e reduzir custos com insumos novos.

Empresas que investem em sustentabilidade também podem acessar incentivos fiscais e mercados que priorizam práticas ecológicas. Um estudo da McKinsey revelou que organizações com forte desempenho em sustentabilidade têm maior probabilidade de superar concorrentes em resultados financeiros.

Para a sociedade, os benefícios são diretos. A redução do lixo eletrônico diminui os riscos à saúde pública associados ao descarte inadequado, como a contaminação do solo e da água por metais pesados. A educação ambiental pode promover um ambiente mais seguro e saudável. Além disso, iniciativas comunitárias que estimulam a participação cidadã na coleta e reciclagem fortalecem laços sociais e aumentam a conscientização sobre questões ambientais.

Mas nem tudo são flores. No Brasil, menos de 3% dos resíduos eletrônicos são reciclados de forma adequada. A falta de infraestrutura para coleta e reciclagem é um dos principais entraves. Embora existam iniciativas como o Acordo Setorial para Logística Reversa, que define metas para fabricantes e distribuidores, muitos municípios ainda carecem de pontos de entrega.

Outro desafio é a complexidade tecnológica envolvida no processo de reciclagem. O desmantelamento manual, ainda amplamente utilizado, eleva os custos operacionais e os riscos para os trabalhadores. Além disso, a diversidade de materiais nos dispositivos torna a separação e a recuperação de componentes valiosos uma tarefa complexa.

A desinformação é mais um grande obstáculo. Embora 87% dos brasileiros afirmem ter ouvido falar sobre lixo eletrônico, muitos confundem o conceito com questões digitais, como spam ou arquivos de computador, o que resulta em descarte inadequado e perda de materiais recicláveis.

Uma forma de tentar superar esses desafios, a colaboração entre governos, empresas e sociedade civil é essencial. A educação ambiental é uma ferramenta fundamental para conscientizar a população sobre a importância do descarte correto. Campanhas informativas podem esclarecer o que constitui lixo eletrônico e como tratá-lo.

Investimentos em tecnologia também são cruciais. Métodos automatizados podem aumentar a eficiência na desmontagem e recuperação de materiais. Parcerias entre empresas tecnológicas e instituições acadêmicas podem acelerar inovações nesse setor. Ademais, políticas públicas devem fomentar práticas sustentáveis, regulamentando eficientemente a logística reversa e oferecendo incentivos fiscais para empresas que adotam iniciativas ecológicas.

Mesmo que os desafios sejam substanciais, as oportunidades para avanços econômicos e sociais também são interessantes. A educação, a inovação tecnológica e a regulação eficaz podem transformar o cenário atual em um futuro mais sustentável. A responsabilidade pela gestão adequada do lixo eletrônico é compartilhada por governos, empresas e indivíduos. Cada um de nós tem um papel crucial na construção de um planeta mais limpo, justo e saudável.

Reitor do Ibmec Rio, doutor em administração pela U/Bordeaux, especialista em finanças e tecnologia*

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postado em 26/12/2024 06:00
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