Após negociação de 25 anos, o Mercosul e a União Europeia deram um passo relevante em direção à integração econômica. O acordo anunciado em Montevidéu, com a participação dos chefes de governos dos países membros sul-americanos e da presidente da Comissão Europeia, ainda precisa vencer diversas etapas antes de ser colocado em prática. Mas o trabalho conjunto tem o seu valor, na medida em que busca reunir condições para se criar uma zona de livre-comércio que pode beneficiar 750 milhões de pessoas, em um mercado que corresponde a 25% do Produto Interno Bruto Global.
O acordo Mercosul-UE significa, ainda, um relevante avanço no multilateralismo. Em um contexto no qual a maior economia mundial, sob a liderança do presidente eleito Donald Trump, pretende avançar com medidas protecionistas, o estreitamento comercial entre os dois blocos econômicos representa uma alternativa estratégica. Trata-se, em última instância, de um posicionamento político ante um cenário econômico acirrado. Como ressaltou a líder europeia Ursula von der Leyen, "em um mundo cada vez mais conflituoso, demonstramos que democracias podem confiar umas nas outras. Esse acordo não é apenas uma oportunidade econômica. É uma necessidade política".
Apesar dos esforços para se chegar a um entendimento, existem obstáculos reais à implementação do acordo. Uma etapa crucial ocorrerá no Conselho Europeu. O texto concluído em Montevidéu precisará ser aprovado por pelo menos 15 dos 27 países que integram o conselho, correspondendo ao aval de pelo menos 65% da população do bloco econômico, o equivalente a 310 milhões de habitantes.
Como esperado, a França capitaneia a resistência à aproximação econômica entre os dois blocos. O Palácio do Eliseu, novamente, deixou clara a insatisfação com os termos negociados, considerados inaceitáveis. Na mesma toada crítica se posicionam Polônia e Áustria. Em compensação, países como Portugal e Espanha saúdam o acordo porque, assim como a presidência da Comissão Europeia, veem vantagens na abertura de livre-comércio.
Do lado sul-americano, espera-se que o avanço do acordo comercial mais complexo negociado no âmbito do Mercosul impulsione o bloco econômico a um novo patamar. Apesar do temperamento histriônico e da postura ultraliberal, o presidente da Argentina, Javier Milei, marca um ponto quando afirma que o Mercosul pode ser comparado a uma "prisão", pois cláusulas internas impedem os países-membros de negociarem acordos bilaterais. O presidente uruguaio, Lacalle Pou, queixa-se no mesmo sentido. "A existência do Mercosul não é contrariada com a flexibilidade do bloco. Sejamos, cresçamos, não atacamos o espírito fundador. Simplesmente progredimos", defendeu.
O Brasil, que exerceu papel fundamental na criação do Mercosul e foi decisivo no acordo com a UE, tem, nessa nova página, a oportunidade de encontrar uma solução que atenda aos interesses dos países-membros e ao setor produtivo nacional.