G20

Inclusão social e habitação no Brasil pelo panorama do G20 Social

Em um país com um dos maiores deficits habitacionais do mundo, a participação de agentes nacionais e internacionais em discussões desse fórum e a visibilidade sobre o assunto podem resultar em avanços significativos

Titular da Assessoria de Participação Social e Diversidade do MDIC, Carmen Silva é reconhecida por seu trabalho de inclusão social no mercado de trabalho
 -  (crédito: Cadu Gomes/VPR)
Titular da Assessoria de Participação Social e Diversidade do MDIC, Carmen Silva é reconhecida por seu trabalho de inclusão social no mercado de trabalho - (crédito: Cadu Gomes/VPR)

Carmen Silva*

Evento inédito, sediado no Brasil, que colocou a redução das desigualdades no centro das discussões internacionais, o G20 Social representou uma oportunidade para o país, especialmente no que se refere ao avanço das políticas públicas de habitação e inclusão social. Em um país com um dos maiores deficits habitacionais do mundo, a participação de agentes nacionais e internacionais em discussões desse fórum e a visibilidade sobre o assunto podem resultar em avanços significativos. 

Hoje cerca de 11 milhões de brasileiros vivem em condições inadequadas de moradia e o deficit habitacional formal é de aproximadamente 7 milhões de unidades, segundo o último levantamento do IBGE. Esse cenário reflete a desigualdade estrutural que o país ainda enfrenta, com grande parte da população mais vulnerável residindo em áreas periféricas, onde a falta de acesso a serviços básicos são problemas persistentes. Ao abraçar discussões sobre esse tema, o G20 Social permitiu que o país dialogasse com outras nações que enfrentam desafios semelhantes, abrindo espaço para ações conjuntas.

Sediar e participar do G20 Social permitiu ao Brasil não apenas debater sobre os próprios problemas, mas também buscar parcerias internacionais e atrair investimentos para resolver questões estruturais, como a moradia. Como sabemos, o deficit habitacional no Brasil é um problema crônico, cujas soluções exigem não só vontade política, mas também uma colaboração eficaz entre o setor público, o setor privado e organizações internacionais. 

Programas como o Minha Casa, Minha Vida demonstraram que é possível implementar políticas habitacionais em grande escala, mas também deixaram claro que o modelo precisa ser aprimorado, especialmente no que se refere à integração urbana. Muitas moradias foram construídas distante dos centros urbanos e sem infraestrutura necessária (transporte público, escolas, hospitais, comércio), dificultando oportunidades de emprego para esses moradores. 

Ainda, com as mudanças de governantes, o Minha Casa, Minha Vida passou por descontinuidades e alterações nas suas diretrizes, o que afetou a sua eficácia e a confiança da população no programa. A modificação das faixas de financiamento e a diminuição de recursos em determinados períodos resultaram em uma desaceleração. Em um dos painéis do G2O Social, pautei esse tema junto ao Ministério das Cidades, da Caixa Econômica e dos movimentos sociais, pois é de extrema importância que tenhamos continuidade no programa assegurado por lei.

Em termos de mobilização de recursos, uma das conquistas concretas oferecidas pelo G20 Social foi o acesso a fundos internacionais destinados ao financiamento de projetos de infraestrutura urbana que respeitam os princípios da sustentabilidade. Exemplo disso foi o acordo do Banco do Brasil com o banco de desenvolvimento alemão KfW e o italiano CDP, em R$ 4 bilhões.

Agora, o Brasil precisa usar sua participação e protagonismo para alinhar a agenda interna com os compromissos globais assumidos no encontro. A pressão internacional exercida pelo evento também pode ser um catalisador para a transformação interna, impulsionando reformas legislativas que favoreçam o desenvolvimento de moradias de qualidade e a redução das desigualdades. A cooperação entre diferentes níveis de governo (federal, estadual e municipal) e a sociedade civil será essencial para garantir que as políticas habitacionais sejam realmente eficazes e atinjam as populações mais vulneráveis. 

O Brasil precisa garantir que os projetos habitacionais não sejam apenas iniciativas de construção de moradias, mas que também incluam medidas para a melhoria das condições de vida e a promoção de direitos básicos. Ao protagonizar um fórum global que discute questões cruciais, como a desigualdade e o desenvolvimento urbano, o país tem a chance de atrair investimentos, aprender com outras nações e adaptar as boas práticas ao seu contexto local. 

No entanto, o sucesso dependerá da capacidade do país de transformar o debate internacional em políticas públicas concretas, que promovam a inclusão social e a redução das desigualdades. Para que o Brasil aproveite plenamente os benefícios do G20 Social, será necessário um compromisso firme com a implementação de soluções locais adaptadas às realidades regionais, sempre com foco na qualidade de vida e na dignidade das populações mais vulneráveis.

 *Urbanista social, líder do Movimento dos Sem Teto do Centro (MSTC), fundadora da Ocupação 9 de julho. Foi secretária no Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços

Opinião
postado em 03/12/2024 04:01
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