Opinião

O clubismo da economia, o rentismo e o combate à desigualdade

O clubismo econômico mantém a pauta do caos para firmar o viés de aumento de juros, alimentando os mais ricos, os rentistas e sufocando os mais pobres

Valdir Oliveira*, Giovanni Bevilaqua**

O futebol, muitas vezes, é um espelho do nosso cotidiano e tem a paixão como força motriz. As análises dos comentaristas esportivos são, não raro, enviesadas pela torcida. É isso que chamamos de clubismo. Tal viés leva ao descrédito das emissoras e do profissional. É assim no futebol, é assim na economia.

Recentemente, saiu mais um boletim de uma instituição respeitada sobre o momento econômico do Brasil. O principal ponto abordado foi a deteriorização fiscal e o ajuste necessário nas contas públicas. A análise traz um ambiente de incerteza econômica e consequente aumento do custo financeiro. Entendem que a situação fiscal e a necessidade de ajuste nos gastos públicos dão maior volatilidade econômica, o que afetaria a confiança dos empresários e dos consumidores.

A visão apresentada pelos analistas, sempre em uma perspectiva negativa de futuro, menospreza o presente. Todavia, não podemos desassociar a política da economia. Por isso, as decisões econômicas e orçamentárias do governo precisam ter a visão da política, mais precisamente da vontade da sociedade. Afinal, as prioridades de um governo devem ser refletidas em seu orçamento e em suas ações. E é aí que entra o clubismo na economia. As análises, muitas vezes, são enviesadas para teses de interesses pontuais, sejam ideológicos ou financeiros.

O deficit nominal brasileiro, segundo o último relatório do Banco Central (Bacen), é próximo de 10% do PIB e vem em uma crescente desde 2022. É verdade que os efeitos da pandemia na economia terão repercussões por muito tempo e influenciarão os resultados, mas é verdade, também, que os desequilíbrios sociais precisam ser compensados por todos, para que possamos ter uma situação equânime de desenvolvimento. 

O maior problema econômico do Brasil é a desigualdade. O seu combate é o maior desafio das autoridades governamentais. Os gastos sociais são tão relevantes quanto são os controles fiscais das contas públicas, porque só assim teremos condições de minimizar os impactos provocados pela desigualdade nos mais vulneráveis. As despesas com saúde, educação, auxílio emergencial e demais programas sociais foram cruciais para evitar um hecatombe social no Brasil, tendo em vista o empobrecimento da população brasileira durante a pandemia. Os programas de apoio aos pequenos negócios, em forma de subsídio, foram fundamentais para a preservação de milhões de empregos. Agora, com a economia se recuperando, vemos indicadores positivos, como a redução do desemprego e o aumento da massa salarial, os quais refletem a volta da confiança da população, após anos de políticas públicas inadequadas.

As análises econômicas que precedem a reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) são potencializadas para decisões de elevação da taxa de juros. E, assim, vamos nos tornando o paraíso dos rentistas. O reflexo dessa decisão é uma taxa de juros criminosa, principalmente dos pequenos negócios, onde alcançam patamares de 60% ao ano. Ao mesmo  tempo, os endinheirados, com aplicações financeiras, conseguem, no mínimo, a Selic, que hoje gira em torno de 11,25 % ao ano, sem nenhum risco. Isso é um desestímulo ao desenvolvimento de negócios. Esse ciclo é alimentado pelo clubismo econômico, que mantém a pauta do caos para firmar o viés de aumento de juros, alimentando os mais ricos, os rentistas e sufocando os mais pobres, sejam pessoas físicas, sejam os pequenos negócios.

Precisamos estancar esse ciclo perverso de concentração de renda que impera no Brasil. Continuando assim, teremos a ampliação da concentração de renda, deixando os mais pobres cada dia mais pobres, e os mais ricos cada dia mais ricos. Para mudar essa lógica, precisamos defender a ruptura do pacto da mediocridade que impera no clubismo econômico e mostrar que estamos com oportunidades de crescimento econômico no Brasil, com distribuição de renda e a geração de empregos. Mas, para isso, é necessária a tendência de queda na taxa de juros brasileira, para inverter a lógica do paraíso dos rentistas para o mundo onde o combate a desigualdade seja o lema da nova era no país. Já passou da hora de o Brasil parar de ganhar dinheiro com dinheiro e aprender a ganhar dinheiro com trabalho, evitando o clubismo econômico e sendo justo na direção do combate à desigualdade no Brasil.

Bacharel em administração*

Doutor em Economia**

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