Artigo

A jornada do negro no mercado corporativo

Embora as empresas já não neguem a existência do racismo, o desafio agora é incorporar a questão racial de forma mais concreta nas estratégias corporativas

Maurício Pestana*

Apesar de o Brasil ser reconhecido por sua diversidade étnica e cultural, as desigualdades raciais estão presentes em diversas esferas da sociedade. No mercado de trabalho, elas tornam-se ainda mais evidentes. A população negra, majoritariamente presente em ocupações manuais, enfrenta uma realidade de disparidade salarial e precarização. Uma pesquisa recente sobre o perfil social, racial e de gênero das maiores empresas do Brasil mostra que o rendimento salarial médio de uma mulher negra é 116% inferior ao de homens não negros. Além disso, a população negra enfrenta maiores índices de desocupação, menor acesso à Previdência Social e uma dependência acentuada do salário mínimo.

A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2023 confirma essa situação. Nos primeiros meses do ano, a taxa de desocupação foi significativamente maior entre negros: 11,3% entre pretos e 10,1% entre pardos. Esses números revelam não apenas a sub-representação dessa população no mercado formal, mas a precarização de seu trabalho.

Embora esteja ocorrendo alguns avanços na presença de negros em diferentes níveis hierárquicos, fruto de políticas de inclusão, a maioria das empresas ainda mantém estruturas que favorecem a ascensão de pessoas brancas. Programas de inclusão e diversidade voltados à população negra são implementados por muitas empresas, mas essas ações ainda não resultaram em maior presença em cargos de liderança.

Em 2020, o Vagas.com divulgou um estudo que revelou que menos de 5% dos trabalhadores negros têm cargo de gerência ou diretoria. Dois anos depois, em 2022, uma pesquisa realizada pelo Instituto Ethos ainda confirmava o dado. Em abril deste ano, outro estudo, agora da consultoria Preta e Cloo, apontou, novamente, que menos de 5% das lideranças das 500 maiores empresas do país são negras. O mesmo dado  apareceu no estudo realizado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Instituto Ethos na Pesquisa Perfil Social Racial e de Gênero, que contou com a participação das 500 maiores empresas do país. O desafio de promover a inclusão racial no ambiente corporativo precisa ser tratado de forma estratégica, com metas claras e um acompanhamento contínuo. Políticas afirmativas de inclusão, embora já em curso, têm avançado de forma lenta.

Criado há uma década, o Fórum Brasil Diverso tem se consolidado como uma plataforma importante para debater diversidade no ambiente empresarial. O evento foi concebido com o objetivo de provocar grandes empresas a repensarem suas políticas de inclusão, incentivando práticas mais abrangentes. A pauta da diversidade tem ganhado destaque também no cenário internacional. Nas eleições da França, por exemplo, temas como protecionismo e xenofobia ocuparam espaço relevante, assim como ocorre na disputa eleitoral dos Estados Unidos.

Neste ano, o Fórum chega a um momento crucial: embora as empresas já não neguem a existência do racismo, o desafio agora é incorporar a questão racial de forma mais concreta nas estratégias corporativas. O foco será ampliar a inclusão de negros em cargos de liderança, onde a representatividade racial ainda é mínima.

A questão racial no mercado de trabalho brasileiro, portanto, é mais do que uma questão de inclusão; trata-se de corrigir uma dívida histórica e de reconhecer que a verdadeira diversidade não se resume à presença, mas à participação ativa e à igualdade de oportunidades para todos.

*Membro do Conselho Administrativo da empresa Alicerce Educação, presidente do Fórum Brasil Diverso, CEO do Grupo RAÇA Brasil de Comunicação

 

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