Aos 95 anos, Fernanda Montenegro não somente construiu carreira admirável como também continua a nos brindar com sua presença ativa e criativa. Aproximando-se do centenário com a mesma energia que a transformou em um dos maiores ícones da dramaturgia mundial, a grande dama das artes cênicas prova que a idade é apenas um número quando se tem paixão pelo que se faz.
Representante brasileira no Oscar em 1999, concorrendo ao prêmio de Melhor Atriz por Central do Brasil, a veterana segue firme no ofício, arriscando-se a mais uma vez comparecer à gloriosa cerimônia com o recente e aclamado filme Ainda estou aqui, em que divide o papel com a filha, Fernanda Torres, em uma rápida, porém deslumbrante aparição. No último dia 13, a imortal da Academia Brasileira de Letras entrou para o Guinness Book por ter reunido um público de 15 mil pessoas para uma leitura cênica no Parque do Ibirapuera, em São Paulo.
Dona Fernanda mostra que a idade não limita; pode, ao contrário, enriquecer ainda mais a capacidade humana de realizar grandes feitos. Com trajetória que se confunde com a da televisão brasileira, essa mulher potente não apenas personifica o talento e a dedicação ao ofício, mas também desconstrói a ideia equivocada de que velhice é sinônimo de obsolescência.
No entanto, apesar desse modelo inspirador, o etarismo está longe de ser uma obra de ficção para milhões de brasileiros. Esse preconceito se manifesta de várias maneiras: na exclusão de pessoas idosas do mercado de trabalho, na invisibilização de suas necessidades e opiniões e na perpetuação de estereótipos que os reduzem a frágeis e incapazes por terem cruzado determinada faixa etária, como se sua experiência e sabedoria acumuladas não tivessem valor.
O etarismo, muitas vezes, se disfarça de uma suposta preocupação com o bem-estar dos mais velhos ou uma aceitação velada de que o envelhecimento deve ser sinônimo de reclusão e silêncio. Essa mentalidade precisa ser rompida em um país em que a expectativa de vida aumenta, para que se reconheça o amadurecimento como etapa natural e valiosa da vida, não o último capítulo dela. Afinal, como bem declarou Charles Saint-Beuve, "envelhecer ainda é a única maneira que se descobriu de viver muito tempo".
A longevidade, como nos mostra Fernanda Montenegro, assim como seus colegas nonagenários Ary Fontoura, Nathália Thimberg, Laura Cardoso, Glória Menezes, Stênio Garcia, Rosamaria Murtinho, Mauro Mendonça, por exemplo, é uma bênção. O tempo ofereceu a eles sabedoria, maturidade e uma compreensão mais profunda de si mesmos e do mundo que os ronda. A sociedade deve valorizar cada uma dessas conquistas. Isso implica uma mudança cultural, em que passemos a ver a idade não como uma limitação, mas como uma oportunidade de crescimento coletivo, reconhecendo a riqueza que os anciãos trazem para nossas vidas.
Há, em cada figura, um legado que irá sempre nos lembrar de vidas inteiras dedicadas ao plantio constante e às belas colheitas, do começo ao fim da vida.