Opinião

A vacina para o ódio é a democracia

O ódio plantado ao longo de todo esse período de extremo radicalismo e polarização é a incubadora de muitos Franciscos por aí. Quantos serão?

Explosão enfrente ao STF -  (crédito: Reprodução Video )
Explosão enfrente ao STF - (crédito: Reprodução Video )

O ódio não tem rosto, nem corpo. Mas pode ser visível, tornar-se concreto por meio de atos, sobretudo os violentos, normalmente antecedidos por avisos não levados em consideração, minimizados em importância. Francisco Wanderley Luiz, o homem-bomba que praticou um atentado ao Supremo Tribunal Federal, deixou suas pistas, mas seu ódio era ignorado pelas instituições, que agora investigam o passo a passo do terrorista.

Francisco não estava sob os holofotes políticos, não era um influenciador, não tinha cargo estratégico e, quando se candidatou, não foi eleito. Por que seria investigado ou monitorado? De fato, não havia razão plausível para preocupar ou mobilizar autoridades. E é aí que mora o perigo. 

Pode-se concluir que Francisco era um zé ninguém? Se foi, ganhou seus minutos de fama com o ato extremo do último dia 13. A pergunta é: quantas pessoas imbuídas de ódio estão dando seus pulos por aí, planejando seu momento apoteótico custe o que custar, em nome de algo que eles, na verdade, nem sabem o que é?

Estamos sob um risco tremendo. É isso o que esse episódio representa. O ódio plantado ao longo de todo esse período de extremo radicalismo e polarização é a incubadora de muitos Franciscos por aí. Quantos serão? Não, não estão isolados, contidos, presos, tomados por algum distúrbio mental. Estão entre nós, talvez propagando avisos não percebidos. Não são lobos solitários à espreita. Ódio pega. Muitas pessoas foram contagiadas, e a raiva ainda fermenta.

A vacina para o ódio é a democracia, o pluralismo político, o debate livre de ideias e o respeito às diferenças. O abismo ocorre quando se torna impossível o diálogo, quando o jogo deixa de ser político. Ou seja, já não se trata de direita ou esquerda. Quantas vezes você ouviu "com fulano, já não dá para conversar" ou "não vale a pena tentar convencer cicrano?". 

Há uma desistência em dialogar, porque as pessoas estão vivendo em suas bolhas, alimentadas por fake news e desinformação, reproduzindo um discurso não baseado em fatos e não estruturado pela educação ou pela formação política. Somos, em maioria, um povo sem instrução política ou midiática, aberto à manipulação, pronto para acreditar em mentiras.  

O ato de Francisco foi planejado, deliberado, executado. Não há insanidade aparente aí. Há um radicalismo supremo, que muito provavelmente foi combatido por algum parente próximo. Pode parecer leviano falar de alguém que se foi com uma atitude tão bárbara, mas é impossível não conjecturar. Parece enredo de filme já visto em momentos muito sombrios da humanidade. Tem exemplo de sobra. 

A escuridão do ódio foi iluminada. Estamos vendo direitinho, querendo enxergar ou vamos apenas achar que um maluco plantou explosivos em frente ao STF, morreu e o caso está encerrado? Ainda há muito a se investigar por parte das autoridades. Mas também há muito o que se refletir: todos nós, cidadãos, estamos cientes dos riscos da propagação do ódio? Já vivemos tempos obscuros. Infelizmente.    

postado em 17/11/2024 06:00
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