Opinião

Cúpula do G20 e a projeção internacional do Brasil

Para o Brasil, a cúpula do G20 representa uma oportunidade para projetar sua política externa e reafirmar a necessidade de reformar a governança global com poder de decisão

PRI-1711-OPINI -  (crédito: Maurenilson Freire)
PRI-1711-OPINI - (crédito: Maurenilson Freire)

» Roberto Goulart Menezes, Professor-associado do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (Irel/UnB) e coordenador do Grupo de Reflexão G20 no Brasil.

 

A realização da Cúpula do G20 Financeiro no Rio de Janeiro, nos dias 18 e 19 de novembro de 2024, será, sem dúvida alguma, o principal evento da política externa do país neste ano. Com o lema "Construindo um mundo justo e um planeta sustentável", sob a presidência brasileira, três eixos foram priorizados: combate à fome, pobreza e desigualdade; emergência climática e a reforma da governança global. 

O sistema que orienta a organização do G20 é o da troika: o país que antecedeu à atual presidência (a Índia, em 2023) e aquele que a sucederá (a África do Sul, em 2025) participam ativamente da agenda organizada pelo Brasil. Por esse instrumento, o país-sede sempre tem uma autonomia relativa e deve dar continuidade às discussões anteriores. Os três países são integrantes do Brics, isso fortalece a possibilidade de elaborarem pautas conjuntas que toquem em interesses comuns dessa coalizão.

Embora o G20 tenha como foco principal temas relacionados à economia e finanças globais, o fato é que a geopolítica permeia sua agenda. A guerra na Ucrânia e a na Faixa de Gaza, por exemplo, farão parte dos debates dos chefes de Estado e de governo. Do mesmo modo, a instabilidade no Oriente Médio, a crescente hostilidade entre o Irã e Israel e o risco de a guerra se alastrar para outras partes da região devem mobilizar a agenda dos líderes do G20. Assim, ainda que não haja consenso a respeito do que deve constar da declaração que costuma ser publicada ao fim de cada cúpula do G20, os temas centrais da geopolítica global farão parte da agenda de discussões das 19 maiores economias do mundo mais a União Europeia e a União Africana (que estreia como membro do grupo neste ano).

Para o Brasil, a cúpula representa uma oportunidade para projetar sua política externa e reafirmar a necessidade de reformar a governança global com poder de decisão, como o Conselho de Segurança da ONU ou o Fundo Monetário Internacional (FMI). O G20 funciona como um espaço de diplomacia para angariar apoios nesse sentido, mas há disputas com outras forças que pretendem manter o status quo, como a União Europeia e os Estados Unidos.

Sem dúvida, a proposta de criação da Aliança Global contra a Fome deve ser o principal legado da presidência brasileira à frente do G20. A dura realidade dos 733 milhões de pessoas que padecem de fome em um mundo de abundância segue sendo um dos paradoxos da realidade internacional.

Outro tema central é a emergência climática. Como país-sede da COP30, que será realizada ano que vem, em Belém, o Brasil tenta convencer os demais membros do grupo a respeito da importância de destravar ou criar mecanismos de financiamento para reverter a degradação da Amazônia. Porém, com a eleição de Donald Trump, a governança do clima sofrerá forte oposição. Aliás, a sua vitória tira parte do brilho da Cúpula do G20, considerando que os compromissos firmados podem ficar apenas no papel, pois Trump deve retomar com carga total seus ataques ao multilateralismo e, com isso, o próprio G20 como principal fórum dos temas econômicos e financeiros pode perder força.

Embora o Brasil tenha priorizado o combate à pobreza e às desigualdades na agenda da cúpula, infelizmente, em razão do aumento da polarização mundial, esse eixo não deve prosperar como o desejável. A edição atual da Revista de Geopolítica, publicada pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), assim como outras publicações acadêmicas recentes, discute as possibilidades e os limites da agenda proposta pelo Brasil e os principais desafios e entraves representados pela geopolítica global. 

De todo modo, ao receber no Rio de Janeiro os países membros do G20, organizações multilaterais e os países convidados, o Brasil tem a oportunidade de reafirmar o papel dos países do Sul global na construção de uma outra ordem internacional, no qual não prevaleça a resignação diante da crise climática, da pobreza e das desigualdades. Oxalá os chefes de Estado e de governo reunidos no Rio de Janeiro ouçam e levem a sério as propostas e recomendações feitas pela sociedade civil, que estará presente na Cúpula dos Povos Frente ao G20.  

postado em 17/11/2024 06:00
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