Maurício Antônio Lopes, pesquisador e ex-presidente da Embrapa
Vivemos uma era em que a velocidade das transformações desafia as premissas de estabilidade e previsibilidade que sustentam muitas instituições. Organizações públicas e privadas, concebidas para oferecer solidez e continuidade, enfrentam hoje um cenário em que estruturas rígidas podem rapidamente se tornar um obstáculo à relevância e à eficácia. Sem adaptação, essas organizações correm o risco de se tornarem vulneráveis e desconectadas das necessidades complexas e interconectadas do século 21.
Nas últimas décadas, avanços em tecnologia, comunicação, biociências e inteligência artificial expandiram radicalmente os limites do possível, impondo às organizações a necessidade de adaptação rápida. Paralelamente, desafios globais, como a crise climática, migrações e cibersegurança, surgem de forma interconectada e simultânea, demandando respostas ágeis que transcendem os modelos tradicionais de gestão e planejamento.
O Prêmio Nobel de Economia de 2024, concedido a Daron Acemoglu, Simon Johnson e James A. Robinson, destacou a importância das instituições para a prosperidade das nações, demonstrando como sua formação e estrutura impactam o desenvolvimento econômico e social. O trabalho desses economistas enfatiza que instituições resilientes e adaptáveis promovem estabilidade e progresso, enquanto instituições rígidas e antiquadas frequentemente bloqueiam avanços.
Os laureados também ressaltam que a evolução institucional não ocorre de forma espontânea, sendo geralmente fruto de escolhas políticas e sociais deliberadas. Suas pesquisas mostram que a prosperidade de uma nação está intimamente ligada ao desenho e funcionamento de suas instituições, moldados por escolhas que refletem as relações de poder, os interesses dominantes e a visão de futuro dos atores sociais.
Contudo, essas escolhas estão longe de serem infalíveis e, frequentemente, levam a problemas recorrentes. Práticas de governança, construção de visão e planejamento costumam priorizar a evolução de ideias e intenções, mas, frequentemente, deixam de lado mudanças estruturais mais profundas. Reformas mais incisivas exigem investimentos significativos e impactam diretamente a vida de funcionários, gestores e públicos atendidos, o que, muitas vezes, desencoraja alterações nos processos e modelos organizacionais estabelecidos.
Não surpreende, então, que haja uma resistência natural a reformas profundas, especialmente as que demandam o desmantelamento de práticas obsoletas, a requalificação de equipes e a reorganização de funções. Em vez disso, ajustes incrementais prevalecem, mantendo uma aparência de modernização sem realmente preparar as organizações para os desafios futuros.
Essa preferência por evitar mudanças estruturais deriva não apenas dos custos financeiros e políticos, mas também da busca por uma estabilidade institucional que, ironicamente, compromete a eficácia no longo prazo. O resultado é uma adaptação lenta e superficial, que rapidamente se torna obsoleta em tempos de transformações rápidas e profundas, deixando as organizações vulneráveis e incapazes de responder a crises complexas.
Uma consequência séria dessa rigidez em muitas organizações essenciais é a perpetuação de estruturas verticais, excessivamente especializadas. Ministérios, agências públicas, departamentos universitários e organizações de pesquisa seguem modelos funcionais e hierárquicos, adequados para lidar com problemas isolados ou em áreas delimitadas, como agricultura, saúde, educação, meio ambiente e energia.
Entretanto, em um mundo de desafios interconectados, esses modelos organizacionais limitam a inovação e a eficácia institucional ao operar dentro de limites temáticos rígidos, com pouca sinergia com a realidade. Na ciência e inovação, essa compartimentalização impede avanços em áreas de alta convergência, como alimentação, saúde, energia e clima.
Uma solução eficaz é a criação de portfólios integrados, reunindo projetos e equipes em torno de temas estratégicos transversais, o que permite uma alocação de recursos mais flexível e alinhada a objetivos ambiciosos. Outra abordagem possível é a reinvenção de formatos institucionais tradicionais, como unidades operacionais mistas ou hubs de inovação, capazes de integrar processos, estruturas e conhecimento para acelerar respostas a desafios complexos.
É, portanto, urgente reconhecer que estruturas rígidas e isoladas já não respondem às demandas deste século e se tornaram grandes obstáculos à inovação. Organizações ágeis e voltadas para a interconexão demonstram hoje uma capacidade única de formar equipes e programas flexíveis, cruzando fronteiras temáticas e hierárquicas para promover uma visão integrada. Sem essa transformação, a relevância institucional estará em risco.