Daniela F. Garrossini*; Doriana Daroit**; Maria de Fátima R. Makiuchi***
Ao longo de suas seis décadas, a Universidade de Brasília (UnB) se consolidou como um centro de excelência acadêmica, mas é necessário reconhecer que seu papel vai além da produção de conhecimento científico. A universidade é também um espaço de convivência, de trocas sociais e culturais e de formação integral de indivíduos.
Em tempos de crise social e política, o desejo de mudança indicado pela comunidade universitária passa por recolocar a UnB como propulsora de iniciativas que promovam a arte, a cultura e o esporte para a construção de um ambiente universitário que favoreça o desenvolvimento humano em todas suas dimensões, a formação profissional e cidadã de seus membros e, simultaneamente, estreite seus laços com o território, especialmente o Distrito Federal, de forma a consolidar sua posição como agente de produção de conhecimento e de transformação social.
Na última década, vimos a Universidade de Brasília abrir mão, paulatina e silenciosamente, do seu papel criativo e ousado no campo das artes e da cultura. Espaços culturais, esportivos e áreas verdes subutilizados, quando poderiam estar exercendo sua missão de permitir a fruição, o lazer, o descanso e o convívio entre os membros de uma comunidade de mais de 50 mil pessoas durante suas jornadas de estudo, trabalho e pesquisa, nos quatro campi que hoje integram a UnB.
A cultura e a arte, dentro do contexto universitário, não são apenas formas de expressão individual. Elas têm o poder de questionar, provocar e inspirar reflexões profundas sobre a sociedade e suas contradições. A UnB, em sua essência, é um espaço de liberdade de pensamento, onde as manifestações culturais devem ser incentivadas como parte do processo pedagógico, pois elas são capazes de proporcionar novas perspectivas sobre questões históricas, políticas e sociais que afetam o Brasil e o mundo. Retomar o protagonismo artístico e cultural da universidade é também reafirmar seu compromisso com a liberdade de expressão, com o respeito à diversidade e com a promoção da democracia.
O desafio que se apresenta à UnB não é apenas o de promover eventos ou criar políticas setoriais, mas de estruturar uma nova visão em que a arte, a cultura e o esporte estejam no centro da formação de sua comunidade. Essa visão precisa estar profundamente conectada à ideia de uma universidade que forme não apenas profissionais, mas cidadãos completos, capazes de pensar criticamente sobre o mundo ao seu redor e de atuar de forma transformadora na sociedade. A universidade necessária de Darcy Ribeiro tem hoje a missão de encontrar caminhos para a reconstrução do tecido social brasileiro, rasgado de forma abrupta e violenta em sua história recente.
Nessa esteira das ações da universidade necessária imaginada por Darcy e Anísio Teixeira, é necessário reorientar estruturas de gestão já existentes, reestruturar espaços culturais e esportivos em todos os seus campi e congregar a diversidade de atores, expressões e pensamentos por meio, por exemplo, de um Fórum de Ciência, Cultura e Arte e da retomada de projetos de relevância em conexão com a sociedade que demonstrem as atividades de pesquisa da UnB, promovam festivais artísticos de música, teatro, cinema, exposições, feiras literárias e eventos esportivos que envolvam os quatro campi e a comunidade do Distrito Federal. A humanização da universidade requer que um senso de pertencimento e integração seja o norte de uma universidade plural, inclusiva, de excelência, socialmente referenciada e disposta a enfrentar os desafios contemporâneos.
A UnB deve ser referência na estruturação dessa cultura inclusiva, democrática, que combate todo tipo de preconceito, seja de raça, cor, etnia, idade, gênero, religião ou ideologia. A universidade é o local do debate livre das ideias. É o local no qual argumentos são importantes e devem ser ouvidos, respeitados e colocados à prova, de acordo com os métodos e teorias de cada área de conhecimento, caso contrário, corre-se o risco da perda irreparável da própria natureza da universidade e de processos importantes na produção de conhecimento que a divergência induz.
O desafio que se coloca para a gestão da UnB composta pelos professores Rozana Reigota Naves e Márcio Muniz de Farias, escolhidos pela comunidade acadêmica para serem reitora e vice-reitor, é justamente o de resgatar seu papel central na construção de um desenvolvimento democrático por meio de seu compromisso com a formação integral, em que a cultura, a arte e o esporte sejam pilares estruturantes de uma universidade viva, pulsante e integrada à sociedade. Não basta apenas oferecer aulas e diplomas; é necessário formar cidadãos engajados, críticos e capazes de transformar o mundo ao seu redor.
*Professora da UnB, vice-coordenadora do Observatório de Políticas Públicas Culturais
** Professora da UnB, coordenadora do Laboratório de Pesquisas sobre Ação Pública para o Desenvolvimento Democrático
*** Professora da UnB, coordenadora do Observatório de Políticas Públicas Culturais
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