No próximo domingo, moradores de 51 cidades brasileiras voltam às urnas para escolher seus prefeitos no segundo turno. Há disputa ainda indefinida em 15 capitais do país — entre elas, metrópoles como Belo Horizonte, São Paulo, Porto Alegre e Belém. Enquanto isso, continua, nos Estados Unidos, a corrida eleitoral entre a democrata Kamala Harris e o republicano Donald Trump. Por lá, o pleito só acontece em 5 de novembro, ainda que a legislação norte-americana permita a antecipação dos votos de maneira presencial e pelos correios em alguns estados. Tanto lá quanto cá, chama a atenção como algumas pautas que sequer deveriam estar em discussão ganham contornos decisivos para as campanhas políticas e por parte da opinião pública.
Em São Paulo, para pegar o exemplo da maior cidade brasileira, Guilherme Boulos (PSol) e Ricardo Nunes (MDB) travaram, no último debate da TV Record, uma troca de acusações para vestir no adversário a roupa do mau-caratismo, da pessoa desonesta, deixando as propostas em segundo plano. Enquanto o emedebista acusou o psolista de calote em um acidente de carro, o deputado federal afirmou que o atual prefeito deu um tiro para o alto em episódio passado. Ambos negam as imputações.
No Estados Unidos, táticas semelhantes das campanhas discutem até mesmo a idade dos candidatos — uma estratégia com todos os traços do etarismo. Diante dos questionamentos sobre a saúde do atual presidente Joe Biden, forçado a desistir do pleito, Trump e Kamala tentam emplacar no outro uma imagem antiquada.
No fim da história, o debate político ganha ares de reality show. Os participantes do processo democrático incentivam as intrigas em nome do entretenimento, como se política fosse lazer. É nesse cenário que os candidatos parecem mais trabalhar suas imagens nas redes sociais do que na realidade, afastando-se dos locais em que os problemas reais da população acontecem.
O alerta vale, inclusive, para candidaturas ditas progressistas. É comum ver planos de governo que prometem diminuir a vulnerabilidade social quando os candidatos, na realidade, pouco conhecem daquela realidade. Até a evitam durante os eventos de campanha, priorizando agendas politicamente corretas, mas que estão muito longe das vilas e favelas. Bonito no discurso, mas muito longe da prática.
Entre os conservadores, a postura tiktoker se volta às frases de efeito. A tão criticada lacração se manifesta mais nesses perfis do que em todos os demais. A preocupação número um é com os adversários. Tenta-se performar para as câmeras situações para constranger os oponentes, novamente afastando-se completamente dos problemas sociais.
As limitações da política contemporânea desafiam o eleitorado no mundo inteiro — o exemplo da corrida eleitoral dos EUA é emblemático. Ainda assim, é papel da população participar de maneira mais ativa do processo de escolha dos seus representantes. É preciso priorizar quem apresenta um plano de gestão coerente com a difícil realidade encarada pelos brasileiros no transporte público, nos centros de saúde, nas escolas e no meio ambiente, somente para citar quatro áreas vistas como prioritárias no momento.
A falta de representatividade afasta o eleitor das urnas, ante uma abstenção que se mantém alta nos últimos pleitos. No primeiro turno, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) registrou um índice de 21,71% de faltantes entre os aptos a votar. Ainda assim, é preciso assumir seu papel democrático até para poder ser agente cobrador de uma sociedade mais justa e heterogênea.