Opinião

Visão do Correio: É dever do STF impedir abusos de poder

Quando o Congresso se arvora ao direito de subjugar o Supremo, volta-se contra aqueles que deveria representar, os cidadãos, cujos direitos cabe à Justiça proteger

O nome já diz: o Supremo Tribunal Federal (STF) é o órgão que representa a instância máxima do Poder Judiciário no Brasil. Atua como defensor da Constituição Federal ao julgar casos de constitucionalidade e inconstitucionalidade, como última instância. Não cabe recurso perante as suas decisões. Diante desse preceito constitucional, não tem cabimento a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) com o propósito de submeter as decisões do STF ao crivo do Congresso Nacional cuja admissibilidade foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados.

Trata-se de uma ofensiva contra a mais alta Corte de Justiça do país que não tem nada a ver com o aperfeiçoamento do Estado Democrático de Direito, no qual os poderes tanto do Executivo quanto do próprio Congresso são limitados pelos direitos e garantias individuais dos cidadãos. A principal missão do STF é coibir abusos do aparato estatal para com os indivíduos. Quando a CCJ se arvora ao direito de subjugar o Supremo, volta-se contra aqueles que deveria representar, os cidadãos, cujos direitos cabe à Justiça proteger.

Um dos projetos aprovados pela CCJ é a PEC 8/21, que limita as decisões monocráticas no STF e em tribunais superiores. Oriunda do Senado, a PEC 8/21 proíbe decisões individuais que suspendam a eficácia de leis ou atos dos presidentes dos Poderes Executivo e Legislativo (Câmara e Senado). O texto também limita decisões individuais à suspensão de eficácia de lei durante o recesso do Judiciário, em casos de grave urgência ou risco de dano irreparável, com prazo de 30 dias para o julgamento colegiado após o fim do recesso.

A PEC estabelece, ainda, o prazo de seis meses para o julgamento de ação que peça declaração de inconstitucionalidade de lei após o deferimento de medida cautelar — depois desse prazo, ela passará a ter prioridade na pauta do STF. Trata-se de um tema controverso, cuja discussão não é nova, mas que está sendo motivada por interesses alheios à defesa da Constituição.

A esdrúxula PEC 28/24, por sua vez, permite ao Congresso Nacional suspender decisões do Supremo. Conforme o texto, se o Congresso considerar que o STF ultrapassou o exercício adequado de sua função de guarda da Constituição, poderá sustar a decisão por meio do voto de dois terços dos integrantes de cada uma de suas casas legislativas pelo prazo de dois anos, prorrogável uma única vez por mais dois anos.

Essas PECs têm duas motivações: a primeira é uma retaliação à suspensão das emendas impositivas apresentadas por deputados federais e senadores ao Orçamento da União, até que o Congresso edite novos procedimentos para que a liberação dos recursos observe os requisitos de transparência, rastreabilidade e eficiência; a segunda visa proteger os vândalos que invadiram os palácios da Praça dos Três Poderes e, agora, estão sendo julgados e condenados pelos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023.

É dever do STF realizar ações para impedir abusos de poder cometidos por membros de outros poderes. Esse é o esquema de freios e contrapesos do nosso sistema político que impede o acúmulo de poder e o estabelecimento de potenciais governos autoritários. Nenhum poder, instituição ou indivíduo está acima da Constituição, o guardião da Constituição é o Supremo.

 

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