Artigo

Inovação no Brasil corre risco de retrocesso 

A retomada do crescimento do país, que não concorre com a saúde pública, perpassa pelo restabelecimento da indústria brasileira no mercado global

HUMBERTO BARBATO — Presidente executivo da Associação da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee)

Iniciativas recentes oriundas do Poder Legislativo perigam impactar negativamente o sistema de patentes no Brasil, aumentando a insegurança jurídica, afastando o estímulo ao desenvolvimento de novas tecnologias e afugentando investimentos externos produtivos no país. 

O Projeto de Lei  nº 2210/2022, aprovado na Câmara dos Deputados, em 29 de junho de 2021, sofreu severas alterações nos artigos 32 e 33 da Lei 9.279/96, que regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial. Entre as modificações, destacam-se as reduções nas possibilidades para realizar alterações voluntárias nos pedidos de patente de invenção apresentados, assim como o prazo de 36 meses garantido pela atual redação do artigo 33 da Lei 9.279/96. Tudo antes de o  Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi)  finalizar o exame dos pedidos de patente para decidir sobre o deferimento ou indeferimento. As propostas do substitutivo visam a alterar o sistema de exame diferido no tempo garantido pela legislação aos que investem em P&D desde 1971. São as mesmas garantias oferecidas aos inventores e investidores em diversos países do mundo.

 Os impactos destas mudanças poderão recair sobre o setor eletroeletrônico, principalmente sobre as indústrias ligadas à área de Tecnologia da Informação e Comunicações (TIC), que estão entre as que mais investem em Pesquisa & Desenvolvimento no país — cerca de 4% do faturamento, muito acima da média da indústria nacional, em 1,2%.

Comprometidas com investimentos em tecnologias para o desenvolvimento do país, como a implantação do 5G e da inteligência artificial (IA), essas empresas, representadas pela  Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), são as maiores interessadas na eficiência do regime jurídico de proteção aos investimentos em P&D conferido pelo sistema de patentes e no bom funcionamento da administração pública federal, especialmente o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi, no que tange à análise de pedidos de patentes de invenção).

A Abinee considera o prazo de 36 meses como essencial para inventores e investidores, visto que garante a eles a oportunidade de analisar a viabilidade de mercado da invenção apresentada no pedido de patente. Se a invenção não tiver potencial de mercado, economiza-se dinheiro e tempo ao evitar a taxa de exame e a carga de trabalho desnecessária para os examinadores de patentes do Inpi. Ademais, os 36 meses são essenciais para atualizar as reivindicações do pedido, à luz do que foi originalmente divulgado. 

A sugestão apresentada no PL nº 2210/22 encontra apoio apenas na indústria brasileira de genéricos, que, por não desenvolver novas tecnologias, não deposita pedidos de patente de invenção. Não nos esqueçamos de que as patentes de medicamentos representam apenas 4,9% entre as mais de 110.825 patentes de invenção em vigor no país (em 27/8/2024). Os setores representados pela Abinee, que são os maiores usuários do sistema brasileiro de patentes, com 21.123 patentes de invenção, representam 19,06% do total. Dessa forma, ao tentar estimular um segmento importante para a saúde pública, a medida pode ter um efeito colateral ao inviabilizar a indústria nacional, que desenvolve tecnologia, fabrica produtos, cria empregos, paga impostos e contribui para as exportações. 

A celeridade no processo administrativo de patentes, tão bem defendido pelo vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, não deve se sobrepor aos interesses daqueles que efetivamente se utilizam do sistema, sob pena do desestímulo ao depósito de novos pedidos de patente.  Diante disso, a Abinee atua na busca de soluções no sentido de modificar e modernizar o sistema de patentes instituído pela Lei 9.279/96. Nesse sentido, articulou junto com o ex-deputado Alexis Fonteyne (Novo-SP) a apresentação no Congresso Nacional do Projeto de Lei nº 2056/2022, que apresenta dispositivo diametralmente oposto ao do PL 2210/22, e que corrige essa distorção. 

A retomada do crescimento do país, que não concorre com a saúde pública, perpassa pelo restabelecimento da indústria brasileira no mercado global. Para tanto, o fomento à inovação é fundamental, mediante a preservação dos direitos dos inventores de novas tecnologias e do fortalecimento do sistema brasileiro de patentes. 

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