Opinião

Deportar milhões de imigrantes dá certo?

A questão da imigração tem aquecido o debate político nos Estados Unidos e na Europa

José Pastore — Professor aposentado da FEA-USP, presidente do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da Fecomercio-SP e membro da Academia Paulista de Letras

A questão da imigração tem aquecido o debate político nos Estados Unidos e na Europa. Donald Trump promete deportar 20 milhões de imigrantes ilegais (sic). E tem apoio de muitos eleitores que sentem o seu emprego ameaçado. O mesmo ocorre na Europa. Na Inglaterra, essa ideia garantiu o sucesso do Brexit.

Apesar de tanta reação contrária, as pesquisas mostram que, do ponto de vista econômico, os imigrantes colaboram muito com os países de destino. Na União Europeia, 22% da população têm origem fora do bloco. Nos Estados Unidos, quase 20% da força de trabalho é formada por imigrantes. 

Nos dois continentes, a maioria dos imigrantes trabalha em atividades rejeitadas pelos americanos e europeus, como agricultura, limpeza urbana, construção, transporte de carga, táxis, hotéis e restaurantes. Na saúde, igualmente, cresce a colaboração dos imigrantes para cobrir a escassez de  profissionais locais de enfermagem, farmácia, fisioterapia e medicina. 

Não há dúvida de que a imigração preenche importantes lacunas no mercado de trabalho naqueles países. Se os imigrantes são importantes agora, eles serão imprescindíveis no médio e longo prazos. Tanto nos Estados Unidos quanto na Europa, a taxa de fecundidade está anêmica — bem abaixo de 2,1 filhos por mulher, que é o mínimo necessário para recompor a população. Com menos crianças, haverá menos jovens e insuficiência de trabalhadores. 

É verdade que a imigração causa despesas e tensões sociais. Isso tem levado as discussões políticas para os extremos. Nos Estados Unidos, Trump defende a bandeira da deportação. Na Europa, os partidos de direita prometem estancar a imigração.

Em artigo recente publicado no jornal O Estado de São Paulo, o professor Oliver Stuenkel, da Fundação Getulio Vargas de São Paulo, mostrou que os imigrantes que moram nos Estados Unidos funcionam como uma espécie de "salva-vidas" em face da escassez de mão de obra que afeta vários setores. Para ele, a eventual deportação dos imigrantes latino-americanos e outros produziria uma verdadeira catástrofe econômica naquele país.

Muitos argumentam que a escassez de mão de obra será compensada com a entrada maciça de novas tecnologias no setor produtivo. Isso é verdade. Mas essa substituição não é trivial nem automática. Várias atividades permanecerão presenciais por um bom tempo. Ademais, as próprias tecnologias criarão demandas, como já ocorre. Cito aqui o exemplo da explosão do setor de logística e de entregas pessoais, que decorreu da rápida expansão das compras on-line, inclusive dos restaurantes, supermercados, farmácias e outros estabelecimentos. 

O processo de destruição e criação de empregos exigirá muita requalificação dos profissionais para atender às novas demandas de trabalho. Os próprios imigrantes passarão por esse processo e, uma vez "repaginados", continuarão a dar a sua contribuição às economias dos países. 

Em nações em que a população cresce pouco e o potencial da economia força o crescimento, a imigração é essencial. Até no Brasil, isso é verdade, como ocorreu no início do século 20, com a chegada de japoneses e europeus e, agora, em pequena escala, para amenizar a escassez de mão de obra que ocorre nos setores da construção, transporte, indústria de alimentos e outras. Entre 2023/24, tivemos um aumento de 53% da entrada de imigrantes venezuelanos, cubanos, nicaraguenses, haitianos, nigerianos e outros. 

Não há dúvida. A imigração tende a ser onerosa a curto prazo, pois demanda muitos recursos públicos. Mas, no médio prazo, a grande maioria dos imigrantes se integra e dá uma colaboração positiva aos países de destino. 

 

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