Como quaisquer outras comunidades, os povos indígenas são vítimas dos efeitos das mudanças climáticas. As chuvas torrenciais ou as longas estiagens impactam a rotina das aldeias, prejudicando a produção de alimentos e a redução da oferta de pescados nos rios, entre outros prejuízos. Neste ano, as queimadas — a maioria delas criminosa — chegaram de forma avassaladora aos territórios indígenas. Entre eles, a Terra Indígena (TI) do Xingu, que abriga mais de 5,5 mil pessoas de 16 etnias.
O recorde de queimadas na Amazônia Legal — 163 mil focos, dos quais 49 mil no Mato Grosso — comprometeu o dia a dia dos que vivem na TI do Xingu. Segundo a série de reportagens Identidade Wauja, publicada nesta semana no Correio Braziliense, com temporais e raios, o fenômeno El Niño deixou, no bioma amazônico, um rastro de danos em algumas comunidades, destruindo moradias cujas paredes são de barro e telhados de palhas.
Os líderes indígenas denunciam que o desmatamento na região não cessa. As atividades predatórias são evidentes, com implicações no regime de chuva e estiagem. Segundo o cacique Akari Waurá, da aldeia Topepeweke, no passado, o período chuvoso começava em setembro. Agora, demora um mês ou mais para o início, e a duração não ultrapassa 90 dias, o que prolonga o tempo de estiagem.
Tanto na Amazônia Legal quanto no Cerrado, a crise climática tem prejudicado seriamente a vida dos brasileiros, sejam, ou não, povos originários ou tradicionais (quilombolas). Na Amazônia, a seca de rios antes caudalosos atingiu níveis, até então, inimagináveis. Entre eles, o Rio Negro, cujo nível de água baixou para 13,59m — quando o normal é de 90m — e o percurso passa por Manaus, capital do Amazonas.
Ao longo dos 1.700km de cumprimento do Rio Negro, cuja nascente é na Colômbia, há 27 etnias de povos originários, sendo 22 em solo brasileiro. Tanto eles quanto as populações ribeirinhas são severamente afetados com a redução no nível d'água. Além da alimentação, a mobilidade fica dificultada. A situação se repete às margens dos rios Javari, Solimões, Branco, Madeira, Purus e outros cursos d'água.
Na região do Cerrado, a crise climática e os incêndios provocados também causam graves transtornos às populações indígena que ali vivem — entre elas, os Xavante, Krahô-Kanela, Tapuia, Guarani-Kaiowá, Terena, Xacriabá e Apinajé. Além das transformações ambientais, a maioria dessas comunidades originárias enfrenta a hostilidade dos invasores dos seus territórios.
Indígenas têm usado as redes sociais para tentar mobilizar a sociedade sobre a situação crítica que enfrentam, mostra a série do Correio. Porém, boa parte da sociedade brasileira ainda coloca em dúvida as alterações evidentes do clima. Essa parcela vira as costas aos alertas dos cientistas, dos povos originários e tradicionais e segue a rota dos negacionistas. Talvez, essa camada da sociedade ainda não tenha percebido que os fenômenos não têm ideologia, opção por regime político e são desprovidos de preconceitos.
Quando os extremos climáticos se manifestam, ferem todos igualmente. Preservar o patrimônio natural do país, reconhecer a lógica da orientação dos especialistas, os da academia e os da tradição, seria uma contribuição mínima para conter o aquecimento global e exemplo à preservação da vida no planeta.
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