Violência contra a mulher

Artigo: Protagonista é a vítima

O filme "Maníaco do Parque" é uma produção que, apesar do título biográfico, não é sobre o serial killer, mas sobre a jovem repórter e sua luta para contar histórias de violências contra as mulheres sob o ângulo das vítimas em uma sociedade machista

Crédito: Cristiano Gomes/CB/D.A Press. Busto de mulher com rosto coberto por mancha preta. -  (crédito: Cristiano Gomes/CB/D.A Press)
Crédito: Cristiano Gomes/CB/D.A Press. Busto de mulher com rosto coberto por mancha preta. - (crédito: Cristiano Gomes/CB/D.A Press)
Neste fim de semana, mais uma vez, fomos atravessados pela ocorrência de um feminicídio. O 17º que ocorreu no Distrito Federal este ano, de acordo com os dados da Secretaria de Segurança Pública. Não era a minha ideia inicial trazer essa pauta novamente para cá. Mas, coincidentemente, no sábado à noite, assisti ao filme Maníaco do Parque, que estreou agora no Prime Video.
Trata-se da narrativa real sobre um dos serial killers mais conhecidos da história recente do Brasil: Francisco de Assis Pereira, o motoboy que cometeu uma série de crimes brutais contra mulheres no final dos anos 1990. 
Maníaco do Parque é uma produção que, apesar do título biográfico, não é sobre o serial killer — um mero prestador de serviço que circula pelas ruas de uma metrópole sobre as duas rodas de uma motocicleta ou de um patins —, mas sobre a jovem repórter Elena Pellegrino (personagem fictícia) e sua luta para conquistar o seu espaço profissional, em um veículo predominantemente machista, contando histórias de violências contra as mulheres sob o ângulo das vítimas.
A cobertura jornalística, um elemento central do filme dirigido por Maurício Eça (o mesmo da trilogia sobre o caso Richtofen), desempenha papel crucial na forma como a sociedade percebe casos de violência contra a mulher. Ao focar no aspecto ultrapassado, vigente à época, o filme reflete sobre o papel da mídia em casos de feminicídio hoje. Assim, o filme se encontra com a linha editorial do Correio, que busca focar na história das mulheres, suas vidas, seus sonhos e a perda sentida por seus familiares, sem glamourizar a violência, com o cuidado de não desumanizar as verdadeiras vítimas da atrocidade.
É nosso papel sublinhar a covardia masculina que muitas vezes deixa órfãos seus próprios filhos, ouvir especialistas, expor o ciclo de agressões que se escalam até o crime brutal, apontar os mecanismos de apoio e segurança, questionar as vulnerabilidades da legislação e conscientizar a sociedade da importância de combater o machismo estrutural.
Francisco de Assis Pereira é um homem com inteligência acima da média e um absurdo poder de sedução que deseja ser famoso, "mesmo que por meio das páginas policiais", como ele próprio escreve em seu diário de anotações. Não é um galã de Hollywood, mas se considera brilhante. Ele desejou e foi o protagonista de uma história macabra que estampou capas de jornais e noticiários da televisão em meio a uma Copa do Mundo. Ainda que tenha sido ofuscado pelo esforço da jornalista, o homem conhecido como Maníaco do Parque será para sempre lembrado — inclusive, tem a sua vida retratada em um filme. Mas quem se lembra quem foram suas vítimas?
Infelizmente, somente quem as conheceu.
Felizmente, porém, o mundo está mudando. E os novos Franciscos já entenderam que não terão mais o mesmo status de celebridade. E isso é mérito de Elenas, Anas, Adrianas, Ailims, Carmens, Darciannes, Letícias, Malcias, Marcias, Marianas, Milas, Nahimas, Sibeles, Rosanes, Taises e tantas outras! Contudo, também de nós, jornalistas do sexo masculino, que, enfim, compreendemos e abraçamos essa causa.

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postado em 22/10/2024 17:26
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