Quando se fala sobre o mundo da bola, a maior parte do debate público se volta ao que acontece dentro das quatro linhas. Gols, passes, dribles, defesas marcantes e até erros de arbitragem ocupam o imaginário popular com contornos de emoção. Nos últimos anos, porém, chama a atenção a ainda limitada discussão sobre a violência contra a mulher no esporte mais popular do país — situação que já colocou atrás das grades jogadores renomados com passagens pela Seleção Brasileira, como Robinho e Daniel Alves.
Na Europa, veio à tona ontem uma investigação do Ministério Público da Suécia que, segundo a imprensa internacional, pode envolver o nome do atacante Kylian Mbappé, estrela do Real Madrid e da França, um dos maiores craques da atualidade. Sua advogada garante a inocência dele. Ainda na Espanha, circulou na imprensa mundial, no mês passado, um "contrato de estupro acidental" que jogadores têm apresentado a mulheres para evitar denúncias de crimes do tipo, diante da alta de casos recentemente. O documento, além de frágil judicialmente, expõe a faceta mais cruel do machismo no futebol. Os atletas invertem a lógica e querem, na prática, ser tratados como uma parcela da sociedade acima do bem e do mal.
Todo esse contexto se soma ao que se vê nas arquibancadas mundo afora. Quem frequenta estádios se depara com frequência com músicas machistas, que objetificam a mulher para provocar um rival — sem contar os olhares indesejados independentemente da roupa usada. O cenário exige que os clubes e as confederações tomem medidas duras para combater a violência contra a mulher no futebol e, mais do que isso, conscientizem seus atletas sobre eventuais crimes que se tornaram recorrentes no noticiário esportivo.
Recentemente, Atlético, Cruzeiro e América marcaram golaços ao divulgarem, entre seus funcionários, inclusive os atletas, o protocolo Fale Agora, desenvolvido pela Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social de Minas Gerais (Sedese-MG) para trabalhar a questão com os departamentos de psicologia e pedagogia dos três principais clubes mineiros.
É papel dos clubes realizar medidas efetivas para reduzir os casos de violência contra a mulher. Pouco adianta aderir a campanhas educativas nos uniformes se, dentro do vestiário, posturas machistas são aceitas sem problematização. Ou se atletas são contratados mesmo com denúncias de crimes contra mulheres. Não se trata de caça às bruxas, mas é preciso prudência para que aquele acusado só volte a ocupar uma posição de destaque após a apuração completa do caso.
Parte desse combate também passa por maiores investimentos no futebol feminino — parcela essa que também cabe ao torcedor cobrar efetivamente seus dirigentes. Além disso, é preciso reconhecer a atribuição que a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) tem nesse necessário combate. Sempre muito preocupada com a Seleção Brasileira, a CBF fecha os olhos para problemas recorrentes da modalidade no país — entre eles, a violência contra a mulher e o machismo abertamente vociferado com orgulho nas arquibancadas. Um problema não só do esporte, mas também dele.
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