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Perspectivas para a política monetária

As especulações sobre a função de preferência de política de Gabriel Galípolo, agora presidente do BCB, pouco contribuem para a construção de um ambiente de confiança necessário para que a inflação convirja para a meta sem novas contrações monetárias

PRI-1010-OPINI -  (crédito: Maurenilson Freire)
PRI-1010-OPINI - (crédito: Maurenilson Freire)

BENITO SALOMÃO — Professor de macroeconomia no Instituo de Economia e Relações Internacionais da Universidade Federal de Uberlândia (IERI-UFU)

Após a aprovação da Lei Complementar  nº 179/2021, que garantiu a autonomia operacional do Banco Central do Brasil (BCB), os olhos se voltam para a primeira substituição na presidência da instituição desde então. Muito embora haja alguns diretores já indicados pelo atual presidente da República, a substituição da presidência do BC acaba sendo mais emblemática. Historicamente, a submissão da autoridade monetária ao governo de plantão, era permeada pelo incentivo da eleição/reeleição e consistia em um risco para a estabilidade macroeconômica. Isso porque políticos tendem a usar a política monetária (também a fiscal) para produzirem "ciclos oportunistas" com vistas a elevar suas probabilidades de vitória eleitoral à custa de desequilíbrios de médio prazo.

A supracitada lei da autonomia vem blindando, até o presente momento, a política monetária brasileira dessas ingerências políticas. Isso ficou bastante claro quando, em 2022, diante de uma inflação persistente e elevada herdada da pandemia, o BCB produziu um duro aperto monetário mesmo em face de um acirrado período eleitoral que se aproximava. Para ser mais claro, a última dose de contração monetária patrocinada pelo BCB durante aquela eleição ocorreu em agosto de 2022, poucas semanas antes do primeiro turno.

Agora, diante da perspectiva da primeira troca do comando da instituição, algumas incertezas aparecem. Isso porque a lei protege a autoridade monetária de interferências políticas durante a vigência do mandato de sua diretoria, porém, a indicação do banqueiro central continua sendo política (e é importante que continue sendo). A indicação política não deveria ser um problema se os economistas concordassem sobre a calibragem da política monetária e os seus impactos macroeconômicos. Porém, discordâncias são o que mais existe entre os economistas sobre essa questão.

Em 1958, Alban Phillips verificou uma relação inversa no comportamento do desemprego e da inflação. Para o autor, quando o desemprego é muito baixo, os salários reais tendem a ser elevados, pressionam os custos das firmas que repassam para preços. O inverso acontece quando o desemprego é alto. A consequência dessa descoberta (relativizada por autores que se debruçaram sobre o tema mais tarde) é que a autoridade monetária pode calibrar a sua política em diferentes pontos com combinações distintas entre inflação e desemprego. Em termos mais técnicos, a descoberta de Phillips inaugurou uma discussão sobre a função de preferências da autoridade monetária, em que há banqueiros centrais que preferem menor desemprego à custa de maior inflação e outros que preferem inflação mais baixa à custa de um desemprego elevado.

Em suma, essa relação inversa entre inflação e desemprego ficou consagrada na literatura como Curva de Phillips e ela supõe que os formuladores de política econômica se deparam com um clássico "trade off" de curto prazo entre inflação e desemprego. No caso brasileiro, embora a lei dê autonomia ao Copom para calibrar sua política monetária, as incertezas que ainda pairam dizem respeito a eventuais diferenças na função de preferências do banqueiro central que entra em relação ao que sai. Pelo menos no tocante à taxa de juros, essa preocupação pode ser arrefecida. Isso porque o Regime de Metas de Inflação pressupõe uma meta inflacionária definida no Conselho Monetário Nacional (CMN). Ademais, a calibragem da política monetária não é prerrogativa exclusiva do seu presidente, mas do Comitê de Política Monetária (Copo que é um colegiado onde o presidente exerce apenas um voto.

As especulações sobre a função de preferência de política de Gabriel Galípolo, agora presidente do BCB, pouco contribuem para a construção de um ambiente de confiança necessário para que a inflação convirja para a meta sem novas contrações monetárias. As condições de trabalho do novo presidente do BCB são bastante objetivas e contribuem para que ele faça um bom trabalho. O Regime de Metas de Inflação acaba de completar 25 anos e, agora, é operacionalizado em um contexto em que presidente e diretores do BCB são protegidos por mandato. Ademais, o RMI vem performando bem nesse quarto de século, de forma que exceto por períodos bastante específicos, como os anos da Nova Matriz Macroeconômica (NMM), a autoridade monetária tem sido capaz de acomodar choques segurando a inflação próxima à sua meta e o PIB no seu potencial.

Em suma, não há qualquer fator objetivo que indique que a era Galípolo no BCB será muito diferente da gestão Campos Neto que se encerra agora. A perspectiva da política monetária para o futuro é de continuidade.

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postado em 10/10/2024 06:00
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