Eleições 2024

Pragmatismo ou polarização? Eleição do Entorno e lições para 2026

O comportamento eleitoral no Entorno do DF não é determinado apenas pela ideologia, mas pela percepção de quem pode fornecer soluções tangíveis

Eleições municipais de 2024 tiverem primeiro turno neste domingo -  (crédito: Caio Gomez)
Eleições municipais de 2024 tiverem primeiro turno neste domingo - (crédito: Caio Gomez)

Gabriel Amaral — Cientista político, doutorando em administração pública e sócio da i3P Risco Político

O cenário político polarizado entre Lula e Bolsonaro pode ser interpretado de duas formas, especialmente quando se analisa o contexto do Entorno do DF após as eleições municipais do último domingo. A primeira interpretação sugere que essa polarização nacional se reflete em todos os níveis da política, e o caráter conservador do Entorno é um reflexo direto da popularidade do bolsonarismo. Dentro desse raciocínio, o sucesso dos partidos de centro-direita na região pode ser visto como uma extensão do apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro, cujas pautas conservadoras ressoam com as preocupações dos eleitores locais.

Há uma segunda interpretação possível: o embate ideológico entre Lula e Bolsonaro, tão central na política nacional, pode não influenciar diretamente as escolhas eleitorais no nível local. Nesse contexto, os eleitores do Entorno tendem a optar por políticos que priorizam questões práticas e imediatas, como saúde, educação e transporte, independentemente de suas afiliações ideológicas, favorecendo aqueles que mantêm o status quo e estão mais alinhados com os interesses locais.

Essa segunda interpretação ajuda a entender o cenário eleitoral do Entorno, que, desde 2018, tem visto uma consolidação dos partidos de centro-direita nas prefeituras da região. Em 12 municípios estratégicos, o União Brasil, o PL e o PP emergiram como as forças dominantes, refletindo a busca do eleitorado por soluções pragmáticas e rápidas para problemas cotidianos. O Entorno faz parte do estado de Goiás, mas sua dependência socioeconômica é do DF, milhares de trabalhadores atravessam diariamente as fronteiras entre essas regiões em busca de serviços e emprego, intensificando a necessidade de políticas públicas que melhorem a mobilidade e os serviços básicos. Nesse sentido, os partidos que prometeram eficiência administrativa e soluções concretas acabaram sendo favorecidos, aproveitando-se da proximidade com a capital federal e suas demandas compartilhadas.

Por outro lado, a esquerda enfrenta grandes dificuldades em captar o apoio do eleitorado no Entorno. A incapacidade de eleger prefeitos nos principais municípios da região evidencia uma desconexão entre as pautas progressistas e as preocupações imediatas da população local. Partidos como o PT, que tem grande influência no cenário político nacional, não conseguiram traduzir suas grandes propostas em ações que atendam diretamente às necessidades locais. Isso sugere que os eleitores do Entorno, em sua maioria, preferem o pragmatismo de partidos que oferecem respostas rápidas aos seus problemas diários, deixando de lado os debates ideológicos. A esquerda, se quiser reconquistar relevância na região, precisará reformular sua abordagem, adaptando suas propostas para dialogar com as demandas concretas do eleitorado.

Essas eleições demonstram que o comportamento eleitoral no Entorno não é determinado apenas pela ideologia, mas, sim, pela percepção de quem pode fornecer soluções tangíveis. Com as eleições de 2026 se aproximando, a tendência de continuidade dos partidos de centro-direita no Entorno parece cada vez mais forte. Os partidos conservadores têm consolidado seu espaço ao entregar respostas práticas aos problemas locais, como a precariedade dos serviços públicos e a necessidade de uma gestão eficiente. Nesse cenário, os partidos que não se adaptarem à realidade local correm o risco de perder ainda mais relevância, já que os eleitores estão focados em resultados, e não em discursos ideológicos distantes.

Independentemente de qual das duas interpretações se adote — polarização nacional refletida nas escolhas locais ou prioridade por pragmatismo sobre ideologia —, o recado das urnas para os partidos de esquerda no Entorno do DF é claro: é preciso repensar suas estratégias e focar nas demandas reais da população. Para sobreviver politicamente na região, a esquerda precisa "pensar onde o pé pisa", ajustando suas propostas para atender às necessidades cotidianas dos eleitores, em vez de insistir em pautas amplas que não ressoam com a realidade local.

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postado em 08/10/2024 06:00
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