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A UnB e a responsabilidade da gestão em proteger direitos

Em decisão confirmada pela Segunda Turma do STF em junho, o ministro Gilmar Mendes restabeleceu a proteção aos valores dos servidores técnicos, enquanto os valores dos docentes permanecem preservados por liminar da ministra Cármen Lúcia

Preservar direitos conquistados é a prova concreta de que eles não são dádivas, mas conquistas fruto de lutas coletivas, associativas, sindicais -  (crédito: Minervino Júnior/CB/D.A.Press)
Preservar direitos conquistados é a prova concreta de que eles não são dádivas, mas conquistas fruto de lutas coletivas, associativas, sindicais - (crédito: Minervino Júnior/CB/D.A.Press)

MÁRCIA ABRAHÃO MOURA — Reitora da Universidade de Brasília (UnB) e JOSÉ GERALDO DE SOUSA JUNIOR — Ex-reitor da UnB

Próximo ao fim da atual gestão da Universidade de Brasília (UnB), em 21 de novembro, compartilhamos memórias comuns à frente de uma universidade que é referência mundial, em razão da singularidade de seu projeto utópico — a universidade necessária, leal ao social, idealizada por Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro para buscar soluções aos problemas do país.

O que nos marca profundamente é ter enraizado no projeto emancipatório da UnB o compromisso com os direitos humanos. Isso inclui a responsabilidade da gestão em proteger os direitos dos seus professores, técnicos e estudantes, além de garantir a proteção da instituição, que enfrentou ataques à sua existência e superou os desafios da pandemia.

Sobre os Direitos Humanos, distinguimos a singularidade de ter dado ao tema relevância científica, apoiando projetos acadêmicos, e prioridade organizacional e hierarquia sistêmica. A UnB é a primeira universidade pública federal a criar, no Conselho Universitário, uma Câmara de Direitos Humanos, além de uma Secretaria de Direitos Humanos para dar organicidade às deliberações da Câmara. Estabeleceu dois prêmios anuais: o Prêmio de Educação em Direitos Humanos Mireya Suarez, que valoriza práticas pedagógicas emancipatórias de Educação em Direitos Humanos; e o Prêmio Anísio Teixeira, que reconhece iniciativas de excelência no ensino, pesquisa e extensão universitárias. Ambos com inscrições abertas até 27 de outubro.

Fomos a primeira universidade federal a instituir uma política de ações afirmativas e de cotas étnicas e raciais, antes de haver previsão legal para tal. Esse pioneirismo foi reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2012, que validou a constitucionalidade do programa da UnB e serviu de referência para todo o sistema de ensino superior.

Preservar direitos conquistados é a prova concreta de que eles não são dádivas, mas conquistas fruto de lutas coletivas, associativas, sindicais. E, claro, com o apoio da gestão. Assim é com a conquista da Unidade de Referência de Preços (URP) por técnicas e técnicos-administrativos e docentes.

Criada por lei em 1987 e suspensa em 1989, voltou após os servidores da UnB recorreram à Justiça do Trabalho. Em 1991, o então reitor Antônio Ibañez, com apoio jurídico do professor Roberto Aguiar, estendeu o benefício a todos os contratados, com base na autonomia universitária. Desde então, o pagamento da URP vem sendo questionado nos âmbitos administrativo e jurídico. Não foi diferente nas nossas gestões.

Em 2010, questionamento do TCU exigiu trabalho incansável de gestão, culminando na liminar, ainda em vigor, da ministra do STF Cármen Lúcia, garantindo o pagamento da URP aos docentes. De 2016 em diante, mantivemos o compromisso de proteger os direitos dos servidores, em parceria com a atuação sindical. Com o apoio de professores da Faculdade de Direito da UnB, realizamos inúmeras iniciativas. Há toda uma saga nesse processo, pode-se dizer dramático, que reflete a luta pela dignidade material ao valor trabalho, que vai além da retórica e se concretiza em medidas efetivas desta gestão.

Agora, vislumbra-se um horizonte de reconhecimento. Em decisão confirmada pela Segunda Turma do STF em junho, o ministro Gilmar Mendes restabeleceu a proteção aos valores dos servidores técnicos, enquanto os valores dos docentes permanecem preservados por liminar da ministra Cármen Lúcia. Nesta sexta-feira, 4, a URP foi garantida pelo STF aos técnicos, após julgamento final.

Vale atualizar o entendimento iniciado com a ministra Cármen Lúcia e por último, conferido pelo ministro Gilmar Mendes: "Fundamento nos princípios da segurança jurídica e confiança legítima" e na "impossibilidade de o Tribunal de Contas da União determinar a supressão, suspensão ou redução da remuneração, proventos ou pensões daqueles substituídos em relação à incorporação do percentual de 26,05% relativo à URP/89, determinada por decisões judiciais transitadas em julgado e por ato administrativo juridicamente perfeito adotado pela Fundação Universidade de Brasília no ano de 1991."

Como expressamos aos ministros do sistema judicial e às autoridades públicas, a questão ultrapassa os aspectos jurídicos, envolvendo o sustento de cerca de 9 mil famílias que fazem da UnB uma instituição de excelência, orgulho do Distrito Federal. São esses princípios humanistas do direito que nos movem e pelos quais continuaremos a lutar.

 


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Márcia Abrahão Moura e José Geraldo de Sousa Júnior - Opinião
postado em 07/10/2024 06:00
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