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Artigo: Falando em voz alta sobre suicídio

Uma mudança que se impõe como necessária e urgente para enfrentar o suicídio está relacionada ao tamanho dos investimentos públicos na prevenção e na assistência às pessoas com sofrimento emocional ou transtornos mentais

 Depressão, suicidio -  (crédito: Marcelo Camargo/Agência Brasil)
Depressão, suicidio - (crédito: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

*Pedro Campos (PSB-PE) e Célio Studart (PSD-CE)

Fazer da saúde mental e do bem-estar de todos uma prioridade absoluta tem sido a motivação de cada vez maior número de pessoas e instituições no país, como demonstra a repercussão crescente que o Setembro Amarelo vem ganhando desde 2013. O 10 de setembro — Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio — consolidou-se como momento de reafirmar compromissos e de celebrar novas alianças, mas devemos estar sempre atentos ao fato de que, por mais que tenhamos avançado nos últimos anos, não chegamos nem perto de uma situação que nos permita relaxar.

Para compreender o tamanho do desafio que ainda precisa ser vencido, basta olhar os números divulgados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pelo Ministério da Saúde (MS). Registram, por exemplo, que, no mundo, morre mais gente como resultado de suicídio do que por complicações decorrentes da contaminação por HIV. Mais até mesmo do que em guerras ou em assassinatos.

Quando se coloca em perspectiva a questão dos jovens (faixa dos 15 aos 29 anos), verifica-se que o suicídio é a quarta causa de morte, superado apenas por acidentes de trânsito, tuberculoses e violência interpessoal. Para piorar ainda mais esse quadro, dados divulgados em setembro de 2022 mostram que, entre 2016 e 2021, houve um aumento de 49,3% nas taxas de mortalidade de adolescentes de 15 a 19 anos, chegando a 6,6 por 100 mil, e de 45% entre adolescentes de 10 a 14 anos, chegando a 1,33 por 100 mil.

Como se muda essa realidade? Olhando com destemor o que temos feito para valorizar os acertos e redirecionar o que precisa ser melhorado. E, sem dúvida, uma mudança que se impõe como necessária e urgente está relacionada ao tamanho dos investimentos públicos na prevenção e na assistência às pessoas com sofrimento emocional ou transtornos mentais. Consegue-se medir o subfinanciamento da assistência à saúde mental comparando os gastos dessa área com os investimentos públicos em segurança pública — sem, com isso, dizer que há gastos em excesso nessa área, longe disso. 

Segundo estudos de especialistas, o Brasil aplica 9,6% do Produto Interno Bruto (PIB) no custeio dos serviços de saúde. Desse total, uma parcela de 3,8% do PIB corresponde aos gastos do governo. Tomando como base o PIB estimado para 2022 — R$ 9,9 trilhões —, constata-se que todos os entes federados investiram neste ano R$ 376 bilhões para cobrir despesas com saúde. 

Acontece que apenas 2% da verba do SUS é destinada à saúde mental e, desse modo, revela-se que foram gastos R$ 7,5 bilhões para lidar com um ambiente onde 16.262 pessoas cometeram suicídio. Por outro lado, olhando as despesas com a segurança pública, evidencia-se que esse segmento contou com valores da ordem de R$ 124,9 bilhões para controlar a violência em um contexto em que foram registrados 47.398 crimes violentos letais intencionais. Ou seja, em um país em que para cada três homicídios contabilizou-se um suicídio, o governo empregou R$ 3 em segurança pública para cada parcela de R$ 0,19 aplicado na atenção à saúde mental.

Como deputados integrantes da Frente Parlamentar Mista para Promoção da Saúde Mental, temos procurado contribuir com a luta para alterar essa realidade, articulando para incluir na pauta projetos de lei importantes. Um desses projetos teve requerimento de urgência aprovado e, agora, vamos trabalhar pela aprovação em plenário. É o PL 4.724/2023 (CD), que estabelece políticas públicas de prevenção e promoção de saúde mental voltadas aos profissionais de saúde, alterando uma série de dispositivos legais regulamentadores do SUS.

Apresentamos requerimento de urgência para o PL nº 4.755/2023, de autoria do deputado Pedro Ahiara, que obriga os conselhos profissionais de classe — como os conselhos regionais de medicina (CRMs) e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) — a manterem programas de prevenção ao suicídio e à automutilação para os seus membros. Regula também a divulgação de dados acerca dos casos ocorridos.

Há ainda três outros projetos na fila, e estamos muito empenhados em fazê-los tramitar. O PL nº 6.227/2023, que tem entre seus autores o deputado Célio Studart, cria mecanismos de combate a práticas irregulares, abusivas ou violadoras de direitos em comunidades terapêuticas. A deputada Tabata Amaral é autora do PL nº 958/2024, que estabelece normas gerais sobre abordagens policiais humanizadas a pessoas em situação de crise de saúde mental. Por fim, há o PL nº 1574/2023, de autoria de Ricardo Silva, propondo a disponibilização, nos hospitais públicos e privados, de sala de descompressão para os profissionais de saúde.

Em suma, é como dissemos acima: há muito a ser feito, e teremos mais êxito na medida em que caminharmos em todas as frentes e com muitas formas diferentes de atuação. É preciso articular esferas administrativas e Poderes, empresas e ONGs, sociedade civil e academia. E é preciso trazer o compromisso para o âmbito individual, onde cada um de nós tem um papel que ninguém mais pode assumir. Olhar em volta, se pôr no lugar do outro, ouvir, sentir, se antecipar. Por fim, e isso não é pouco, precisamos falar — em voz alta — sobre o suicídio, afrontando o tabu. Esse comportamento pode salvar vidas. 

*Deputados federas e membro da Frente Parlamentar Mista para Promoção da Saúde Mental

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postado em 20/09/2024 06:00
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