Entre as muitas carências do país, a falta de educação, em todos os níveis, a ganância e o negacionismo, em boa parte, explicam os incêndios criminosos que se alastram pelo Brasil. A preservação do meio ambiente é condição imprescindível à vida humana, mas o imediatismo por riqueza fala mais alto. Os efeitos da destruição do patrimônio natural não são restritos a uma parcela da população daqui ou de outra acolá. Toda a sociedade é afetada. No campo, a situação tem um agravante: a perda de produção de alimentos e de cultivos destinados à exportação, o que impacta diretamente o agronegócio.
Quando a ministra Marina Silva, do Meio Ambiente, levanta a suspeita de que os focos de incêndio são criminosos, não se trata de uma leviandade. O estado de São Paulo enfrenta queimadas sem precedentes. O governador Tarcísio de Freitas, semanas atrás, anunciou a prisão de alguns suspeitos, que iniciaram incêndios para ganhar R$ 300. A mesma situação ocorreu em Goiás — o provocador da queimada também foi renumerado para praticar o crime. No início da semana passada, a Flona do Distrito Federal ardeu em chamas e pelo menos três suspeitos foram detidos pela polícia.
Hoje, três biomas — Cerrado, Pantanal e Amazônia — estão sendo queimados em proporções sem precedentes. A ministra Marina antevê que o Pantanal mato-grossense pode desaparecer caso persistam os ataques premeditados. Ela não fala de uma área qualquer. O Pantanal é a maior planície alagada do planeta, com área de 124.457 Km², estendendo-se pelos estados de Mato Grosso do Sul e do Norte, e em parte dos vizinhos Paraguai e Bolívia. Uma área com fauna e flora, que abriga espécies singulares, muitas ainda não descritas pelos especialistas. Até o último dia 8, o bioma havia perdido 2,5 milhões de hectares.
A tragédia ocorre também no Cerrado, um bioma vítima da ganância e dos desprezo dos seus exploradores. No primeiro semestre deste ano, foram identificados cerca de 11 mil focos de queimadas — 31% a mais do que no mesmo período do ano passado. Mais da metades desses incêndios ocorreu no Matopiba (acrônimo com a primeira sílaba dos estados de Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), região onde avança a agropecuária, com destaque para a produção de soja, milho e algodão, responsável por 10% da produção nacional de grãos e fibras. Ao contrário da Amazônia, no Cerrado, os produtores rurais podem explorar 80% da propriedade e preservar 20% da cobertura vegetal.
A Amazônia tem sido o bioma mais ambicionado pelos predadores do patrimônio natural do país — a maior floresta tropical do planeta. Os ataques são promovidos por garimpeiros, sustentados pelo crime organizado do Sudeste, madeireiros, grileiros e invasores inimigos dos povos indígenas e dos territórios tradicionais dos quilombolas. Só neste ano, foram identificados 16.447 focos de incêndio, segundo o Programa Queimadas, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Nos primeiros quatro dias deste mês, foram 1.212 focos de queimada, e, em agosto, 10.328 — 186% mais do que a média mensal de 3.606 focos registrados, acrescenta o Inpe.
É este Brasil que, no ano que vem, sediará a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas. A reunião será no Pará, um importante estado da Região Amazônica, cujo cenário é dramático. Entre as muitas motivações para a degradação da natureza, há a falha na educação ambiental, que deveria compor a grade de disciplinas em todas as escolas do país, a fim de que crianças, jovens e adultos aprendessem a ter uma relação respeitosa com o meio ambiente. Mas nem tudo é como deve ser. Vivemos no Brasil.
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