MOZART NEVES RAMOS — Titular da Cátedra Sérgio Henrique da USP de Ribeirão Preto e professor emérito da Universidade de Pernambuco (UFPE)
No último mês de agosto, o Ministério da Educação divulgou os resultados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) de 2023 — o indicador que mede a qualidade da educação brasileira, conforme a Meta 7 do Plano Nacional de Educação (2014-2025). Esse indicador incorpora no seu cálculo dois fatores: a proficiência escolar em língua portuguesa e em matemática, proveniente do exame do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), e a taxa de aprovação. Assim, para cada etapa escolar — anos iniciais e finais do ensino fundamental (EF) e ensino médio (EM) — é possível atribuir um IDEB, como resultado da multiplicação desses dois fatores, para as redes de ensino e escolas de todo o Brasil.
Após a pandemia, o país iniciou uma grande cruzada para aquilo que ainda está sendo chamado de recomposição da aprendizagem, face aos impactos negativos no desempenho escolar, em particular das crianças em processo de alfabetização e dos anos iniciais do ensino fundamental. Apesar desse esforço, os resultados do SAEB, para as três etapas avaliadas, revelam que o país está literalmente estagnado na educação — olhando a média Brasil. Sobre esse tópico, recomendo a leitura do artigo Os grandes estão derrubando a educação, escrito pela Priscila Cruz, presidente-executiva do Todos pela Educação, na Folha de São Paulo, de 25 de agosto. Esse artigo traz um novo olhar do que chamei de estagnação.
É verdade que melhoramos em relação a 2021, especialmente para os anos iniciais. Todavia, não foi nada que nos permitisse retornar a 2019. Senão, vejamos: as proficiências médias no SAEB em língua portuguesa no 5° ano do EF foram 214,64, 208,09 e 213,89 para os anos de 2019, 2021 e 2023, respectivamente; as proficiências em matemática foram 227,88, 216,92 e 224,83 para os respectivos anos de 2019, 2021 e 2023. Como podemos constatar, ainda não retornamos aos resultados de 2019 de antes da pandemia, que já eram pífios.
É preciso um choque de gestão na educação. Se continuarmos a fazer mais do mesmo, não vamos sair do lugar, enquanto os países desenvolvidos já estão em voo de cruzeiro. O Ideb revela ainda a enorme desigualdade educacional em nosso país, que está literalmente dividido: Sul/Sudeste e Norte/Nordeste. Mas isso não é de agora.
A resposta para melhorar a educação do Norte/Nordeste possivelmente venha da própria região. Falar do sucesso de Sobral e do Ceará é chover no molhado". Os estados do Piauí, Pernambuco e Alagoas são destaques na região em algumas etapas escolares — não em todas. Outro exemplo: as 21 escolas que tiraram nota 10 no IDEB são todas do Nordeste (15 do Ceará, cinco de Alagoas e uma de Pernambuco), e todas do interior desses estados. Um exemplo até certo ponto inovador vem da região oeste do Maranhão. Lá, foi constituído um regime de colaboração intermunicipal envolvendo alguns municípios em torno de Açailândia, no contexto dos chamados Arranjos de Desenvolvimento da Educação (ADE), seguindo orientação do Plano Nacional de Educação — artigo 7°, inciso 7°. Uma região relativamente pobre do ponto de vista socioeconômico, mas que se juntou para vencer as próprias dificuldades. Vou aqui dar os resultados do Ideb de 2021 e 2023 de alguns desses municípios: Açailândia saiu de 4,6 para 5,5; Bom Jesus das Selvas, de 4,3 para 5,1; Itinga, de 4,2 para 5,1; São Francisco do Brejão, de 4,0 para 4,8; e assim vai.
Por outro lado, fica também no Nordeste brasileiro o estado de pior resultado no Ideb nas três etapas escolares — anos iniciais e finais dos ensinos Fundamental e Médio. Trata-se do Rio Grande do Norte, acompanhado de perto pelos estados de Sergipe e Bahia. A desigualdade existe dentro do próprio Nordeste!
Mas a grande novidade positiva desta edição do Ideb veio do estado do Pará, que, historicamente, sempre ocupava as últimas posições. Desta vez, o estado deu um verdadeiro "salto quântico". Encostou entre os primeiros do ranking nacional do ensino médio.
Por fim, quando falo em choque de gestão, é no sentido de começar a fazer diferente, pois fazer mais do mesmo não vai adiantar. E não são coisas mirabolantes, que custam muito dinheiro. São coisas simples, como ouvir quem está fazendo a mudança acontecer e aprender com eles. Outra iniciativa no âmbito da gestão é colocar em prática o regime de colaboração, especialmente entre municípios pequenos, que não são muitas vezes "enxergados" na esfera federal, como estão fazendo aqueles do oeste do Maranhão. Vejo também nas parcerias públicas e privadas, as chamadas PPPs, um caminho estratégico para melhorar os resultados educacionais. Isso já vem acontecendo com sucesso na oferta de vagas em creches, mas há espaço para crescimento em outros setores educacionais.
Não se trata apenas de colocar mais dinheiro na educação — algo que, de fato, o Brasil ainda precisa caso queira um dia chegar próximo aos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e fazer uma comparação justa no exame do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa). Termino usando uma expressão que já está ficando comum nos meus artigos: o Brasil pode aprender com o Brasil, ou, ainda, o Nordeste pode aprender com o Nordeste.
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