Giorgio Romano Schutte*, Gilberto M. A. Rodrigues**
O Brasil reassume seu protagonismo global nas questões sociais, de governança global e meio ambiente, com a presidência brasileira do G20, em 2024, e do Brics e da COP-30, no ano que vem. Com esperança renovada, representantes da sociedade civil retomaram, nesse contexto, uma pauta de mais de 20 anos e formalizaram a proposta de criação de um Conselho de Política Externa (Conpeb) ao Itamaraty e à Presidência da República, recebendo reações positivas. Cabe agora ampliar ainda mais o debate por um Conselho que reflita a diversidade e a experiência internacional da sociedade brasileira.
A ministra Esther Dweck, da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, afirmou recentemente em um evento paralelo ao G20, realizado pela sua pasta com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que o Estado do futuro deveria ser "extremamente participativo". De fato, o terceiro governo Lula retomou a organização dessa participação nas instâncias do Estado para possibilitar a participação social na construção, no monitoramento e na avaliação de políticas públicas. Foi criado, inclusive, um Sistema de Participação Social Interministerial.
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Um argumento para não haver o Conpeb é que conselhos de participação são para políticas públicas, e política externa não seria uma política pública, mas uma política de Estado. Grande debate, mas, pelo menos em tese, já superado. Como diz o site da Secretaria Geral da Presidência, "a participação social é estratégia do governo federal para a construção de políticas públicas internas, e não é diferente na agenda internacional".
Houve, em vários momentos, uma participação pontual expressiva e construtiva desde a conferência no Rio 1992 sobre meio ambiente e desenvolvimento e a de Durban contra o racismo e a discriminação racial, em 2001. Da mesma forma, houve uma mobilização expressiva contra a Área de Livre Comércio das Américas (Alca) e a participação no processo de integração regional com o Mercosul Social. Em todos esses casos, o debate ligava a política externa a seus impactos internos, tanto na geração de emprego e renda, como direitos humanos ou ambientais, trazendo pautas relevantes para o desenvolvimento do país. Por outro lado, também nunca faltou acesso aos negociadores e formuladores da política externa via balcão para interesses econômicos específicos, como os do agronegócio.
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Na primeira Conferência Nacional sobre Política Externa, realizada na Universidade Federal do ABC, em São Bernardo do Campo, em 2013, um conjunto significativo de atores da sociedade civil entregou uma carta ao então ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, que se comprometeu a levar adiante a criação do Conpeb. Após aquele momento, o país começou a passar por turbulências políticas que levaram à derrubada da presidenta Dilma Rousseff, em 2016, e à ascensão de governos que suspenderam o ciclo virtuoso de participação social, democrático e transparente, e arquivaram as conversas já em fase avançada para a criação do conselho. Mesmo assim, a ideia permaneceu viva, em fóruns como o Grupo de Reflexão em Relações Internacionais (GR-RI) e a Rede Brasileira de Integração dos Povos (Rebrip), entre outros, que congregam diversas organizações e especialistas do campo. Cabe, agora, incorporar outros setores, como o empresarial.
Por tudo isso, há de se saudar a entrada na agenda do Palácio do Planalto da proposta de decretar a instalação de um Conselho de Política Externa Brasileira, que deve permitir um diálogo mais permanente e reconhecer as interfaces com as várias áreas nas quais já houve essas experiências de participação pontual. Não há dúvida de que, assim como aconteceu em outros setores, o Conpeb deve contribuir para que as políticas que orientam a inserção internacional do país reflitam cada vez mais a diversidade de visões e interesses da sociedade brasileira como ela é.
Professores de relações internacionais da Universidade Federal do ABC (UFABC) e membros do Observatório de Política Externa e Inserção Internacional do Brasil (OPEB)*