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Artigo: Desafios no combate ao câncer de pulmão: perspectivas do 1º congresso nacional

O congresso discutiu a necessidade de políticas públicas mais robustas para a prevenção e o diagnóstico precoce do câncer de pulmão. Apenas 15% dos casos da doença são descobertos em estágios iniciais

Carlos Gil Ferreira* Presidente do Instituto Oncoclínicas e presidente de honra da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica

O 1º Congresso Brasileiro de Câncer de Pulmão, realizado em Brasília, neste mês, foi um marco importante na luta contra uma das doenças mais letais e desafiadoras da saúde pública no Brasil. O evento proporcionou uma plataforma importante para abordar as questões mais urgentes no diagnóstico e tratamento do câncer de pulmão.

A sessão de abertura, no Senado Federal, marcada pela presença de importantes autoridades políticas e de saúde, foi um momento de grande relevância. Com a participação do secretário Adriano Massuda, representando a ministra da Saúde, Nísia Trindade Lima, e de especialistas renomados, como Margareth Dalcolmo, o evento ressaltou a urgência de melhorias estruturais e do acesso ao tratamento no Sistema Único de Saúde (SUS). 

Representando a Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC) na Aliança contra o Câncer de Pulmão, pude destacar a importância dessas questões. Um dos principais focos foi a discussão sobre o Projeto de Lei nº 2.550/2024, que estabelece diretrizes para a política de rastreamento e diagnóstico precoce do câncer de pulmão. A aprovação desse projeto não apenas traria avanços significativos na redução da mortalidade da doença, mas também resultaria em uma economia substancial para o sistema de saúde ao mitigar os altos custos associados ao tratamento de casos em estágios avançados.

Um dos pontos mais debatidos durante o congresso foi a necessidade de políticas públicas mais robustas para a prevenção e o diagnóstico precoce do câncer de pulmão. A doença, que é a principal causa de morte por câncer no Brasil, é diagnosticada em estágios iniciais em apenas 15% dos casos, o que contribui para as baixas taxas de sobrevida. Existem estudos que apontam que aproximadamente 80% dos custos do SUS com câncer de pulmão estão relacionados à doença avançada, o que reforça a importância de se investir em políticas de rastreamento, especialmente para fumantes e ex-fumantes a partir dos 50 anos. Com base nesses dados, a Aliança contra o Câncer de Pulmão está empenhada em promover a implementação de programas de rastreamento com tomografia computadorizada de baixa dose (TCBD), que já demonstraram eficácia na redução da mortalidade em países que adotaram essa prática.

Além das discussões sobre políticas públicas, o congresso foi um espaço para a troca de conhecimentos entre especialistas de diferentes áreas. O avanço nas terapias-alvo e na imunoterapia para o câncer de pulmão são inovações que têm o potencial de transformar o tratamento da doença, oferecendo novas esperanças para pacientes com diagnóstico em estágio avançado. No entanto, um dos desafios é como garantir que essas inovações cheguem a todos os pacientes, especialmente aqueles atendidos pelo SUS, onde o acesso a tratamentos de ponta ainda é limitado.

A colaboração entre as principais sociedades médicas do país, reunidas na Aliança contra o Câncer de Pulmão, se mostrou fundamental para promover uma abordagem verdadeiramente integrada e multidisciplinar no combate a essa doença. A superação do câncer de pulmão depende da união de esforços entre oncologistas, pneumologistas, cirurgiões torácicos, radioterapeutas, patologistas e especialistas em diagnóstico por imagem. A Aliança está comprometida em expandir a conscientização pública, capacitar profissionais de saúde e impulsionar o uso de tecnologias digitais para que os benefícios do rastreamento e do tratamento cheguem às populações em áreas mais remotas do país.

Outro ponto de reflexão é a necessidade de superar o estigma associado ao câncer de pulmão, muitas vezes relacionado ao tabagismo. Embora seja o principal fator de risco, é preciso que a sociedade entenda que o câncer de pulmão pode afetar qualquer pessoa, inclusive não fumantes, e que todos os pacientes merecem o melhor cuidado possível. Esse estigma contribui para a negligência em relação ao diagnóstico precoce e ao tratamento adequado, o que agrava ainda mais o impacto da doença.

Saio deste congresso com um sentimento renovado de urgência e determinação. Ele foi apenas o primeiro de muitos passos que devemos dar para transformar a realidade dessa doença no Brasil. Estou convencido de que, ao unir ciência, política e sociedade em torno de um objetivo comum, podemos fazer avanços significativos no combate ao câncer de pulmão, reduzir sua incidência e mortalidade e proporcionar um futuro melhor para aqueles que convivem com a doença.

O congresso de 2024 foi uma oportunidade única para reunir especialistas, políticos e a sociedade civil em uma causa de extrema importância. É nossa responsabilidade coletiva continuar essa luta, avançando em políticas públicas, educação, pesquisa e, acima de tudo, em empatia com nossos pacientes. O futuro do combate ao câncer de pulmão no Brasil depende das ações que tomarmos agora, e estou confiante de que estamos no caminho certo.

 * Presidente do Instituto Oncoclínicas e presidente de honra da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica

 

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