Artigo

Ilegalidade dos cigarros eletrônicos conduz o Brasil a uma tragédia social

O caminho para proteger os adolescentes é ter regras claras de comercialização e punições para quem vende ou oferece para essa faixa etária

Eduardo Gomes *

Com um olhar de quem assiste ao Brasil conviver com a ilegalidade e com um volume gigantesco de cigarros eletrônicos sendo vendidos a céu aberto a crianças e adolescentes, e uma proibição que favorece apenas ao crime organizado, a Comissão de Assuntos Econômicos do Senado vai avaliar o Projeto de Lei nº 5,008/2023, de autoria da senadora Soraya Thronicke, amanhã. O PL estabelece a criação de regras para produção, importação, exportação, comercialização, controle, fiscalização e propaganda dos cigarros eletrônicos.

Reitero a extrema importância do assunto que se torna cada vez mais urgente, uma vez  que o país vive uma tragédia social com milhões de dispositivos sendo comprados livremente no mercado ilegal e consumidos por pessoas de qualquer idade,  sem nenhum tipo de controle da saúde pública ou das forças de segurança e sem nenhuma condição do Estado colocar um aparelho à disposição da fiscalização. Ou seja, a simples proibição da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) não tem surtido efeito, e o Estado brasileiro precisa tomar uma providência e estabelecer um controle absoluto.

O cenário é estarrecedor e de total descontrole. Segundo o Ipec, quase 3 milhões de adultos consumiram vapes em 2023, um aumento de 600% nos últimos seis anos. Além disso, menores de 18 anos acessam facilmente produtos 100% ilegais e de procedência desconhecida. Nesse contexto, é urgente a criação de regras para controle e proteção dos consumidores. Sem a regulamentação adequada, é como se as pessoas estivessem comprando remédio controlado sem receita, sem o controle das farmácias.

A preocupação com os jovens é legítima e a proibição, definitivamente, não é a solução para o problema. Nos países em que há regras claras, o índice de consumidores entre os que são menores de idade é inferior ao do Brasil, onde, mesmo proibido, a taxa de experimentação é de 16,8%, segundo o IBGE (2019). Os Estados Unidos experimentam a redução no consumo entre adolescentes, após eficiente regulação, com uma queda de 57,4% de 2019 a 2023, saindo de 5 milhões de consumidores menores de 18 anos em 2019 para 2,13 milhões em 2023.

O caminho para proteger os adolescentes é ter regras claras de comercialização e punições para quem vende ou oferece para essa faixa etária. Aliás, vale lembrar: no Brasil, é crime fornecer produto que possa causar dependência física ou psíquica a menor de 18 anos. Por esse motivo, foi incluído no projeto uma proposta de multa no valor mínimo de R$ 20 mil, bem como a aplicação em dobro das penas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente para quem vender cigarros eletrônicos a menores de 18 anos.

Outro aspecto tão importante quanto às questões de segurança — e que compete à Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) opinar — é o mérito econômico e financeiro da proposta que envolve essa regulamentação, assim como outras comissões específicas avaliarão posteriormente o que lhes cabe. Uma vez na legalidade, os fabricantes, importadores, exportadores e os comerciantes terão registro e controle, permitindo a arrecadação de impostos correspondente à atividade. A importação e a comercialização dos dispositivos eletrônicos para fumar são realizadas à margem do sistema tributário, com elevadas perdas de arrecadação. Hoje, o mercado é dominado pelo contrabando que, como sabemos, financia todo tipo de ilegalidade e crimes no país.

Não dá para fechar os olhos para a situação atual e achar que proibir vai resolver o problema. Não resolveu e não resolverá. A crescente utilização dos cigarros eletrônicos tem acontecido à revelia de qualquer regulamentação. Temos a responsabilidade de criar regras e deixar muito claro que este tipo de produto não deve ser consumido. E, se o cidadão maior de idade e munido das informações necessárias quiser utilizar o produto, que o Estado não feche os olhos.

 *Senador da República pelo PL-TO e relator do PL 5.008/2023, na Comissão de Assuntos Econômicos

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