Causam preocupação as recentes medidas tomadas por integrantes do Congresso Nacional. Em um intervalo de duas semanas, o Legislativo impôs uma sequência de movimentos que suscitam questionamentos sobre o papel dos parlamentares na defesa do interesse público.
Tome-se como exemplo o caso das emendas parlamentares. Em resposta às decisões do ministro do Supremo Tribunal Federal Flávio Dino de suspender a tramitação das proposições enquanto não fossem observados os princípios constitucionais de transparência e rastreabilidade de recursos públicos, retiraram-se da gaveta projetos de lei que buscam cercear o Poder Judiciário. Uma das iniciativas pretende anular os efeitos de decisões monocráticas do STF — quando o próprio tribunal já impôs, em resolução interna, limites a esse expediente. Acrescente-se que o entendimento de Dino sobre as emendas parlamentares não é mais monocrático: foi referendado por unanimidade pela Suprema Corte. O posicionamento do Judiciário sobre o tema, pois, passou a ser em nível colegiado, não havendo mais razão para questionamento.
O outro projeto aventado no Parlamento em retaliação à postura do STF é um claro disparate. Delega ao Legislativo o poder de derrubar decisões colegiadas da mais alta Corte de Justiça. De tão absurdo, não merece maiores considerações.
Outros movimentos revelaram à opinião pública o espírito que tem movido deputados e senadores. O mais notório é a flexibilização da Lei da Ficha Limpa. Em votação simbólica, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou projeto de lei que reduz o prazo de inelegibilidade de políticos condenados. A estratégia é clara: amenizar a punição de afastamento da vida pública o máximo possível. Assim, políticos com pesadas condenações por crimes como corrupção — algumas na casa de 10 anos ou mais de pena — ficariam impedidos de concorrer a cargos públicos por apenas duas eleições.
O terceiro exemplo que desabona a conduta dos parlamentares pode ser considerado como fato consumado. Na última quinta-feira, o Senado promulgou a lei conhecida como PEC da Anistia. Além de perdoar de forma generosa partidos políticos que descumpriram a legislação eleitoral, reduz a destinação de recursos do Fundo Eleitoral para candidaturas negras — em um país em que os negros formam a maioria da população, mas são exceção nos espaços de poder.
Espera-se que os integrantes do Parlamento com espírito público — e há muitos, sem dúvida — atuem para evitar os excessos que têm sido vistos nas últimas semanas. Deputados e senadores têm reivindicações legítimas — como a prerrogativa de apresentar emendas ao Orçamento —, mas deveriam buscar o aperfeiçoamento do trâmite legislativo em vez de partir para retaliações a outros Poderes. Do mesmo modo, é óbvio que matéria legislativa precisa ser aprovada levando-se em conta a opinião pública. Afinal, é o dinheiro do contribuinte que sustenta institutos como o bilionário Fundo Eleitoral e o salário e vantagens dos parlamentares.
Mais responsabilidade, mais comedimento. Essa deve ser a conduta recomendável para o Congresso Nacional no trato das questões públicas, bem como na relação com os Poderes da República.
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