Eu estava em Caracas, em 8 de março de 2013, para cobrir as cerimônias fúnebres do presidente Hugo Chávez. O que vi foi uma onda de comoção que beirava à catarse. Multidões em filas quilométricas, muitos venezuelanos enfrentavam até 12 horas de fila para nem sequer ter um minuto diante do caixão. O Passeio dos Próceres, no coração de Caracas, tinha se transformado em um imenso velório, mas também em um centro de comércio. Era possível comprar quase tudo o que tivesse o rosto de Chávez.
Mas foi naquela noite que algo me chamou a atenção. As pessoas, emocionadas e envoltas na bandeira da Venezuela, pararam diante dos telões para escutar o longo discurso de Nicolás Maduro, já envolto com a faixa presidencial. Prestou homenagens a Chávez e prometeu manter-se fiel à Revolução Bolivariana, o tal do socialismo do século 21 que afundou a Venezuela na miséria. Era como se parte do carisma de Chávez tivesse, de imediato, sido herdada por Maduro ou transferida para ele. Nos rostos enlutados dos venezuelanos, havia tristeza e dor, mas também esperança.
Em quase 12 anos de governo, Maduro provocou uma catástrofe socioeconômica às custas da adoração ao conquistador Simón Bolívar, da idolatria a Chávez — o qual garante ter aparecido para ele na forma de passarinho e de montanha — e do ódio aos ianques e imperialistas. Aferrou-se ao poder e solapou qualquer resquício de democracia, por ínfimo que fosse. A visita de Maduro ao mausoléu de Hugo Chávez, na manhã de domingo, talvez fosse o preparativo para o desfecho das eleições de 28 de julho. Maduro procurou manter acesa a adoração por Chávez. Ainda que muitos venezuelanos estejam sedentos de virar a página.
Ao juntarmos todas as pontas, fica claro que uma vitória nas eleições seria o único resultado plausível para Maduro. Imantado pela aura chavista, ser derrotado no dia do aniversário de seu ideólogo e criador seria uma catástrofe. A Maduro apenas restava uma escolha: a vitória. Autêntica ou fabricada. Por bem ou por mal. Pela sobrevivência de seu projeto populista autodestrutivo e pelo futuro da cúpula de governo tomada pela corrupção. A vontade do povo, para Maduro, é mero detalhe. Agora, as ruas cobram do presidente a verdade.