André Gustavo Stumpf*
O governador Clécio Luís, do Amapá, perguntou, recentemente, numa entrevista: "Quem disse que queremos ser santuários de alguma coisa?" A indagação simples, solta no meio da conversa, demonstra que nada mudou na relação do governo federal com a Amazônia. A discussão persiste sendo a quantidade maior ou menor de incêndios florestais, e nada prospera em termos de aproveitamento econômico da região. Os órgãos ambientais retardam a decisão sobre prospecção de petróleo na chamada Margem Equatorial, a 500 quilômetros da foz do Rio Amazonas. Não autorizam sequer a Petrobras fazer pesquisa para saber quanto há de petróleo na área.
Na realidade, o governo federal e, de certa forma, os estaduais esbarram nas exigências dos países europeus e na atuação vigilante das organizações não governamentais. Os estrangeiros, por razões diferentes, pretendem que a Amazônia permaneça intocada. Os fazendeiros norte-americanos não escondem sua opção, digamos, política: "farms here, forest there" (fazendas aqui, floresta lá). Ou seja, a floresta deve ser preservada como santuário para que os turistas possam fazer viagens exóticas, fotografar macaco e jacaré, além de provar ervas alucinógenas. As ONGs obedecem a variadas opções: umas defendem o meio ambiente, de fato. Outras trabalham conectadas a interesses comerciais diversos. A Amazônia foi, desde sempre, o paraíso de picaretas de todas as espécies, desde contrabandistas de metais preciosos até vendedores de madeira originária de desmatamento ilegal.
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Os governos se enrolam nessa teia de interesses divergentes e preferem fazer o discurso politicamente correto que não resulta em nada proveitoso para os brasileiros que vivem na região. O descaso é tão flagrante que a estrada que liga Macapá à fronteira com a Guiana Francesa, cuja construção foi recomendada pelo Barão do Rio Branco quando da assinatura do tratado de limites com a França, com cerca de 600 quilômetros, ainda permanece com a metade em piso de terra, sempre um atoleiro no período das chuvas. Em Roraima, onde foi aberta excelente oportunidade de negócios e investimentos, com a descoberta de petróleo na Guiana, ex-inglesa, o governo não se movimentou.
O pessoal que trabalha na área de defesa do meio ambiente não cria empregos, mas impede que sejam criados por outras áreas da atividade econômica. O grande mérito daquela turma é dizer não. Os discursos são lindos; os resultados, pífios. Mas há diferenças. Quando a Petrobras descobriu o imenso lençol petrolífero no chamado Pré-Sal, ninguém levantou qualquer objeção sobre os perigos que a prospecção poderia oferecer para os estados lindeiros. Todos estão sujeitos a vazamento de óleo. Aconteceu em vários lugares do mundo. A Petrobras sabe lidar com o assunto, mas ninguém ousou tocar no assunto para não prejudicar os royalties que Rio de Janeiro, São Paulo, Espírito Santo, entre outros, recebem. A Amazônia constitui desafio que os brasileiros não conseguem decifrar. Entre o discurso nacionalista dos militares e o preservacionista do pessoal do meio ambiente, mais de 20 mil garimpeiros ganham seu sustento vendendo ouro para contrabandistas internacionais, que são grandes casas de comércio norte-americanas e europeias. E não recolhem impostos.
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O presidente Lula esteve em Santa Cruz de la Sierra, Bolívia, onde discursou para saudar a entrada da Bolívia no Mercosul. A Petrobras vai voltar a investir naquele país, coisa que não fazia desde 2006, quando suas instalações foram nacionalizadas e invadidas pelo exército de Evo Morales, o cocaleiro que dirigia o país vizinho. A novidade é que os dois países assinaram tratados para compra de matéria-prima, lítio, gás e material para produção de fertilizantes agrícolas. Além disso, os brasileiros vão elevar a cota da Hidrelétrica de Jirau para 90 metros e, assim, permitir que ela gere mais 500MW, cujo terço será vendido para a Bolívia e, dessa forma, auxiliar na eletrificação da Amazônia Ocidental e nas áreas bolivianas de fronteira com o Brasil. As hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio, situadas em Rondônia, geram energia para consumidores do Centro-Sul.
São iniciativas destinadas a melhorar a integração regional e abrir uma avenida de oportunidade para estados brasileiros nas regiões Centro-Oeste e Noroeste. Os dois Mato Grosso poderão utilizar a malha rodoviária dos países vizinhos para levar sua produção até os portos peruanos no Pacífico. Em contrapartida, os bolivianos poderão utilizar portos brasileiros para sua exportação. O presidente Lula promoveu esse pequeno avanço na região mais preocupado com o vizinho do que com a Amazônia brasileira. Ainda assim, é um avanço. O aumento da cota de Jirau vai alagar algumas áreas no Brasil e na Bolívia. Mas isso ninguém percebeu.
*Jornalista