Educação

O mundo mudou, mas a escola (no Brasil), não!

O país avançou muito pouco no campo da aprendizagem escolar e na redução das desigualdades educacionais. Para sair dessa quase estagnação, é preciso reconhecer que as escolas precisam mudar

Mozart Neves Ramos —Titular da Cátedra Sérgio Henrique Ferreira do Instituto de Estudos Avançados da USP de Ribeirão Preto e professor emérito da UFPE

Resistimos em não mudar e vamos pagar um preço muito alto. O nosso ensino é ainda sedimentado no conteudismo num cenário disruptivo, e isso não combina. Continuamos firmes olhando apenas para o retrovisor e nos esquecemos, ou não queremos, olhar para onde aponta o farol. Em outras palavras, continuamos a preparar nossos estudantes para o passado do professor, e não para o futuro que há de vir. 

Não quero aqui deixar de reconhecer alguns avanços que o país alcançou, em particular nessas últimas três décadas. Cito a título de exemplo, políticas públicas de financiamento e de avaliação do ensino extremamente robustas com as implantações do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) e do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), respectivamente. O Brasil criou, em 2007, um indicador de qualidade para a educação com o advento do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), e, com ele, foi possível instituir metas para as redes públicas de ensino.

Apesar disso, o país avançou muito pouco no campo da aprendizagem escolar e na redução das desigualdades educacionais. Para sair dessa quase estagnação, é preciso reconhecer que as escolas precisam mudar. A solução não está apenas na tecnologia, mas, sem ela, não vamos conseguir na dimensão de que precisamos. Precisamos incluir, em seu portfólio, as novas plataformas digitais, além de preparar professores para o uso adequado da inteligência artificial no processo de ensino e de aprendizagem. Mas como fazer isso se a maioria das escolas públicas não está nem sequer conectada a uma boa rede de internet? Sem falar que uma grande parte dos professores está no nível 2 de competências digitais, em uma escala de 1 a 5 (mais alto), desenhada pelo Centro de Inovação da Educação Brasileira (Cieb). 

A partir de 2025, o Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa), da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), vai focar em competências tecnológicas para medir o aprendizado dos alunos na faixa etária de 15 anos. A edição Aprendendo no Mundo Digital avaliará também a aprendizagem autorregulada e a investigação computacional e científica. 

Como mostrou Silvio Meira — um visionário nesses tempos disruptivos — em seu texto A escola e a virtualização do aprendizado, nos Estados Unidos, a partir de 2025, todas as escolas públicas e quase todas as salas de aulas estarão na rede, com menos de 10 alunos por computador, em média. Isso a um custo anual de pouco mais de R$ 200 por aluno/ano. Só que o investimento em habilitação docente para enfrentar os desafios das novas tecnologias está em cerca de R$ 20 por aluno/ano, contra os R$ 60 por aluno/ano recomendado pelo Departamento (Ministério) de Educação daquele país. Como resultado, apenas 10% dos professores se acham muito bem preparados para usar as tecnologias na sala de aula, conclui Silvio.

Mas não estamos apenas falando de competências digitais, de novas tecnologias e suas plataformas, mas também de outras que são igualmente importantes para se viver nesse novo ambiente, como a criatividade e o pensamento crítico. Na sua última edição de 2022, o Pisa trouxe como grande novidade a mensuração do pensamento criativo e de sua relação com a proficiência escolar em leitura, matemática e ciências. Singapura, Coreia do Sul, Canadá, Nova Zelândia, Estônia e Finlândia obtiveram os melhores resultados em termos de pensamento criativo, com um escore médio por aluno de 36 pontos, enquanto a média da OCDE foi de 33 pontos. Singapura obteve o melhor resultado com 41 pontos. O Brasil obteve apenas 23 pontos.

Qual a importância disso para o aprendizado escolar? As pesquisas mostram que há uma relação direta de maiores níveis de aprendizagem escolar em estudantes com tais competências mais desenvolvidas, como aqui mostrou o Pisa para o pensamento criativo. Porém, o mais importante desse relatório da OCDE foi a clara sinalização de que a escola do futuro não pode ser mais conteudista. E o futuro chegou! 

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