Opinião

Visão do Correio: Um recado para as democracias

O atentado contra Donald Trump, no último sábado, serve de alerta para todo o mundo sobre os riscos da extrema polarização política

O candidato republicano Donald Trump é visto com sangue no rosto cercado por agentes do serviço secreto ao ser retirado do palco em um evento de campanha no Butler Farm Show Inc. em Butler, Pensilvânia, 13 de julho de 2024 -  (crédito: Rebecca DROKE / AFP)
O candidato republicano Donald Trump é visto com sangue no rosto cercado por agentes do serviço secreto ao ser retirado do palco em um evento de campanha no Butler Farm Show Inc. em Butler, Pensilvânia, 13 de julho de 2024 - (crédito: Rebecca DROKE / AFP)

A imagem de Donald Trump com o rosto ensanguentado e o punho em riste conclamando os apoiadores para a luta logo após sofrer um atentado ganhou o mundo. Entrou para a iconografia americana, sendo, inclusive, comparada à histórica imagem de fuzileiros navais hasteando a bandeira estadunidense na ilha de Iwo Jima, uma fortaleza japonesa, na Segunda Guerra Mundial. No imaginário coletivo, também está sendo confrontada com a imagem atual do adversário Joe Biden — cresce a percepção de que o democrata não tem mais vigor físico e cognitivo para seguir na Presidência. É cedo para afirmar os impactos do episódio do último sábado nas eleições de novembro, dizem especialistas. Mas é certo, desde agora, que o que aconteceu no comício na Pensilvânia serve de alerta para todo o mundo sobre os riscos da extrema polarização política. 

Líderes foram enfáticos nesse ponto ao repudiar a tentativa de  assassinato sofrida pelo candidato republicano que tenta voltar à Casa Branca. Segundo o presidente francês, Emmanuel Macron, trata-se de uma "tragédia para as democracias". O primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, disse que "a violência política, em qualquer forma, não tem lugar em nossas sociedades". Ao ser questionado se o atentado poderia favorecer candidaturas da extrema-direita, o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, respondeu não saber, mas ter certeza de que o episódio "empobrece a democracia".

Declarações com conhecimento de causa. Em 2016, uma semana antes do Brexit, o referendo para a saída do Reino Unido da União Europeia, a parlamentar trabalhista pró-europeia Jo Cox foi morta a tiros e facadas por um agressor de extrema-direita. Uma França bastante polarizada acaba de finalizar as eleições legislativas marcadas por campanhas violentas — incluindo agressões físicas a candidatos e apoiadores dos diferentes polos. E o Brasil começa as eleições municipais sob uma forte polarização política há pelo menos uma década, quando Dilma Rousseff foi reeleita para a Presidência, e a expectativa de que os próximos resultados das urnas vão desenhar a disputa de 2026.   

O processo da volta de Lula à Presidência em 2022 demonstra o quanto a violência política e eleitoral tem crescido no país. Pesquisa das organizações de direitos humanos Justiça Global e Terra de Direitos mostra que os dois meses que antecederam o primeiro turno daquele pleito registraram quase o mesmo número de episódios de violência política e eleitoral do que os sete primeiros meses de 2022. Entre 1º de agosto e 2 de outubro, ocorreram, em média, dois casos de violência política por dia. Até 2018, uma pessoa era vítima a cada oito dias, a partir de 2019 o período médio entre um registro e outro caiu para 48 horas.

A arraigada desigualdade social, a prática disseminada de corrupção e a forte sensação de insegurança estão entre os fatores que têm levado os brasileiros a se identificarem com os discursos radicais. Em outros países, pesam questões como imigração, repressão a movimentos populares e acesso facilitado às armas. Quaisquer que sejam os motivos, ataca-se diretamente o diálogo, um dos pilares da democracia, sempre que divergências políticas são resolvidas à bala ou com qualquer outro tipo de violência. Não faltam relatos e imagens também históricos atestando as consequências desse perigoso caminho. 

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postado em 16/07/2024 06:00
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