ROSELI GARCIA*
Será que vamos sair dela? Se o Brasil tem um pouco de reciclagem, agradeça aos catadores que atuam na maioria das cidades do país, como autônomos ou em cooperativas. Raramente, existe apoio das prefeituras municipais. Esse foi o cenário pintado durante o Congresso Internacional Cidades Lixo Zero, ocorrido, de 25 a 27 de junho último, no Museu Nacional da República, em Brasília. O encontro teve como premissa despertar a sociedade para medidas sustentáveis em todos os níveis. Seja de cada cidadão, que tem a responsabilidade pela separação do lixo de sua casa, seja de empresas na substituição de plástico por materiais sustentáveis e, ainda, do poder público.
A representação do Governo do Distrito Federal apontou um diagnóstico que deixa muito a desejar sobre seus moradores. Diariamente, 1,2 mil toneladas de lixo são despejadas no aterro sanitário do DF. Esse volume poderia ser reduzido em 500 mil quilos se a população separasse de forma adequada o material reciclável do orgânico.
Mesmo com cooperativas de catadores atuantes em diversas regiões, convênios com o DF, há um enorme desperdício iniciado nas residências. Na tentativa de contribuir com o aumento da reciclagem, produzi um e-book (https://roseligarcia.orbitpages.online/) com o passo a passo sobre a separação de lixo doméstico.Trata-se de uma gota de contribuição em meio ao oceano de plástico mostrado pela ONG Oceana neste mês. O cálculo é que entram 8 milhões de toneladas de plásticos nos oceanos por ano.
Em Brasília, os participantes do evento puderam conhecer iniciativas de cidadãos, cooperativas, comunidades, que alimentam a esperança da construção de um mundo cada vez mais sustentável. Iniciativas incluem os cidadãos no processo da separação de material reciclável e orgânico, minimizando os impactos ambientais. Tudo começa a mudar com esse gesto simples de responsabilidade de cada morador.
Com mais lixo reciclado, menos bueiros serão entupidos e, consequentemente, haverá menos enchentes. Lembrem-se que garrafas pets, latas e vidros jogados nas ruas ou em lixões transformam-se em criadouros do mosquito da dengue. Portanto, todos têm benefícios com o aumento da reciclagem que começa em casa.
O Brasil ainda está patinando neste quesito. Em 2022, apenas 4% de 81 milhões de toneladas de lixo, produzidas pelos brasileiros, foram recicladas. É chocante! Um desperdício de latas, plásticos, vidros e papelão transformados em montanhas de lixo na natureza.
O país perde R$ 14 bilhões por ano com a falta de reciclagem. As empresas perceberam a questão econômica e implantam medidas para a reciclagem, mas ainda é insuficiente. Em ano de eleição municipal, seria importante conhecer as propostas dos candidatos. Será que estão incluindo a questão ambiental? A reciclagem?
Afinal, parte do Rio Grande do Sul está debaixo d'água e o Pantanal enfrenta, de novo, uma fogueira que parece mais uma visão do inferno. Todos estão percebendo que as mudanças climáticas atingem a população e novas atitudes serão necessárias. Vamos começar pela reciclagem? Não é solução para todos os problemas, mas um ponto de partida.
O Cidades Lixo Zero mostrou iniciativas capazes de mudar a percepção de comunidades sobre a coleta de material reciclável, desperdício de comida. Mas como fazer para que essas atividades despertem o interesse da população?
Ações mais impactantes sinalizam o caminho da mudança, mesmo que seja solitário no início. Um senhor transformou o seu bar em Paraty (RJ) em ponto de coleta e museu da reciclagem. Diego Saldanha criou a ecobarreira para limpar o rio em que nadava na sua infância, no município de Colorado (PR). Acabou criando também o museu do lixo. A iniciativa de Diego chamou a atenção da mídia, mas não da prefeitura local. Moradoras do Morro dos Prazeres, no Rio de Janeiro, construíram hortas para evitar o desperdício de restos de alimentos que são usados nos jardins. A iniciativa gerou o Instituto Ser e expandiu os horizontes.
Regina Tchelly tem feito sucesso com alimentos inusitados, produzidos a partir de cascas, talos e sementes, normalmente jogados no lixo. Ela criou o Favela Orgânica nas comunidades da Babilônia e Chapéu Mangueira, unindo conceitos de consumo consciente, gastronomia alternativa, compostagem caseira e hortas em pequenos espaços. A atitude de Regina deu tão certo que ela passou a fazer oficinas em diversos estados e até no exterior. Levou seus conhecimentos sustentáveis a países conhecidos por sua gastronomia, como França e Itália, além do Uruguai.
O responsável pelo evento em Brasília, Instituto Lixo Zero Brasil, tem uma missão ingrata: convencer a indústria a trocar embalagens de plástico e isopor por materiais sustentáveis. Será? O oposto disso estamos vivenciando com enchentes que matam, destroem cidades, calor intenso, queimadas e desmatamentos que acabam impactando na economia. Basta escolher qual mundo queremos.
* Jornalista e escritora
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