A morte da influencer Aline Ferreira depois de passar por um procedimento estético em Goiânia me fez entrar numa espécie de cápsula do tempo e lembrar da cobertura de um dos casos mais marcantes da história da capital federal: o do ex-médico Denísio Marcelo Caron. No início dos anos 2000, no começo da minha trajetória profissional, a sociedade brasiliense acompanhava em choque o desdobramento das investigações contra Caron.
Em uma época que a internet ainda caminhava e as redes sociais eram inexistentes, Caron não estava habilitado para realizar cirurgias plásticas, mas, mesmo assim, se apresentava como um "especialista em lipoaspiração". Começou a carreira em Goiânia, mas logo se mudou para o Distrito Federal, quando teve o registro profissional suspenso após três mortes por infecção generalizada na capital goiana.
Aqui no DF, mais duas pacientes morreram e dezenas sofreram lesões corporais durante os procedimentos médicos. Lembro-me de entrevistar as vítimas e, em comum, muitas contaram que chegaram até Caron graças ao menor preço e à propaganda boca a boca feita pelas pessoas. Duas décadas depois, o modelo de arregimentar clientes segue parecido, mas com um agravante: as redes sociais amplificaram a oferta de serviços de pessoas sem a qualificação necessária para realizar os procedimentos e sem fiscalização nenhuma.
As investigações preliminares sobre a morte de Aline indicam que Grazielly Barbosa, responsável por aplicar PMMA (polimetilmetacrilato) no glúteo da influencer, não era formada em nenhum curso superior. Apresentava-se como biomédica, só que, na verdade, frequentou apenas três períodos de medicina em uma faculdade do Paraguai. Em resumo, uma charlatã. Qualquer um pode ser o que quiser na internet.
E é justamente esse ponto que precisa de uma atenção especial da sociedade e, principalmente, das autoridades. É inadmissível que plataformas digitais se tornem palco para a proliferação de profissionais não qualificados que oferecem procedimentos estéticos de risco. Está na hora de termos regras rígidas para a verificação de identidade e qualificação, além de mecanismos para combater a publicidade enganosa. É necessário também envolver as empresas fornecedoras de produtos para garantir que a venda seja restrita a profissionais habilitados.
A busca por procedimentos estéticos a preços baixos também pode ter consequências trágicas. É fundamental que os consumidores se informem sobre os riscos envolvidos, busquem profissionais idôneos e evitem se basear apenas em promessas milagrosas nas redes sociais. Um valor bem abaixo do cobrado pelo mercado é sinal de que tem algo errado. É necessário ainda um debate amplo sobre os padrões de beleza. Só assim será possível se evitar novas tragédias.
Saiba Mais
Gostou da matéria? Escolha como acompanhar as principais notícias do Correio:
Dê a sua opinião! O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores pelo e-mail sredat.df@dabr.com.br