Diversidade

E por falar em orgulho

Apesar dos avanços, devemos pontuar que a violência homofóbica segue sendo uma triste realidade, e que o povo negro ainda é a maior vítima desse cenário

LARISSE LOPES — Advogada, atual vice-presidente da Comissão de Diversidade Sexual e de Gênero da OAB/DF

Em 28 de junho é celebrado o Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA . A data remete ao início dos protestos de 1969, denominados Revolta de Stonewall. O Stonewall Inn foi um bar nos Estados Unidos que sofreu represália policial por receber frequentadores LGBTQIA e fixou a data como um marco de uma série de manifestações de resistência à violência policial.

E, por falar em orgulho, utilizaremos a data para pontuar e celebrar importantes passos. Sabemos que a Constituição Federal determina como objetivo do Estado promover o bem-estar de todos, sem preconceito, e determina que todos são iguais perante a lei, sem distinção. Apesar de vedar a discriminação, a garantia do exercício de direitos somente foi conquistada após grandes esforços da comunidade.

Somente em 1991, a Organização Mundial da Saúde (OMS) excluiu a homossexualidade da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas relacionados com a Saúde (CID 10). Em 1985, no Brasil, o Conselho Federal de Medicina removeu o "homossexualismo" da lista de transtornos. Inclusive, o termo é pejorativo, por ter conexão com patologia. O correto é homossexualidade.

Em 1999, por intermédio da Resolução nº 1/1990, foi vetado aos psicólogos realizar qualquer atividade que viesse a patologizar a homossexualidade, proibindo terapias que visassem a "cura gay" ou reversão à heterossexualidade.

Importante não confundir orientação sexual com identidade de gênero. A orientação sexual é determinada pelo desejo em relação ao outro. Ou seja, se a sua atração está direcionada ao sexo oposto ou ao mesmo sexo, por exemplo. A identidade de gênero refere-se à forma como cada pessoa se percebe no mundo, ou seja, se o indivíduo se percebe enquanto mulher ou não, por exemplo. 

Em relação à identidade de gênero, a transexualidade somente veio a ser despatologizada em 2019, quando a OMS removeu o "transtorno de identidade de gênero" da Classificação Internacional de Doenças. Pouco depois, o Sistema Único de Saúde passou a realizar cirurgias de redesignação sexual. Outro passo importante foi a possibilidade de modificação de gênero e nome no Registro Civil, quando foi editado o Provimento nº 73/2018, da Corregedoria Nacional de Justiça.

Quanto ao reconhecimento civil das relações, em 2011 a matéria foi levada ao Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) que, em julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4.277 e da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132, reconheceu a equiparação da união estável entre pessoas do mesmo sexo àquelas entre casais heteroafetivos. 

Apesar da equiparação, a formalização do casamento somente veio a ser garantida dois anos depois, quando o CNJ aprovou a Resolução nº 175, impedindo que os cartórios recusassem a habilitação, celebração de casamento civil ou conversão de união estável em casamento entre pessoas do mesmo sexo. 

Quanto à adoção de crianças, embora não houvesse qualquer objeção legal, a garantia do exercício do direito também precisou ser confirmada pelos tribunais superiores. 

Outro marco importante na evolução dos direitos LGBTQIA foi a equiparação da homofobia ao crime de racismo. A criminalização da homofobia é uma pauta que tentou avançar no Legislativo, sem sucesso. Em 2019, por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 26, a matéria foi levada a julgamento ao STF, que reconheceu a mora do Congresso Nacional e julgou pelo enquadramento da homofobia e transfobia como tipo penal definido na Lei de Racismo (Lei nº 7.716/1989). 

Outra restrição modificada foi a de autorização para que pessoas LGBTQIA doassem sangue. Ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5.543, em 2020, o STF declarou a inconstitucionalidade de dispositivos que estabeleciam restrições à doação.

Apesar dos avanços, devemos pontuar que a violência homofóbica segue sendo uma triste realidade, e que o povo negro ainda é a maior vítima desse cenário. Segundo dados do Relatório de Violência Homofóbica, elaborado pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR) em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), ao mapear o perfil das vítimas, constatou-se que pessoas negras chegam a ser o dobro das vítimas de violência homofóbica, em comparação às demais raças/cores autodeclaradas.

E por falar em orgulho, devemos celebrar toda a caminhada, mas não podemos deixar de reforçar a história, os avanços como meio de resistência a retrocessos e discriminações que ainda persistem.

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