A decisão do Supremo Tribunal Federal de que o porte de maconha para uso pessoal não é crime, mas um ato ilícito, com sanções previstas na legislação, e de que a venda de entorpecentes continua sendo ilegal deu a largada para uma série de reações que veremos nas próximas semanas. Politicamente, a primeira discussão será na Câmara, que já tem uma comissão especial engatilhada para analisar a PEC das Drogas.
Juridicamente, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) vai dar início a um mutirão para corrigir prisões após a fixação dos critérios pelo Supremo para o porte de maconha: 40g e seis plantas fêmeas. E aqui é importante deixar claro que descriminalizar o porte não significa legalizar o consumo de maconha. É, sim, um avanço no sentido de diferenciar o usuário do traficante.
Hipoteticamente comparando, o usuário ser flagrado com menos de 40g de maconha passa a se equiparar com o caso do motorista que é parado em um blitz de trânsito com o IPVA vencido. Não é crime, mas o produto, no caso o veículo, tem que ser apreendido. Não significa que andar com a droga é liberado, mas, sim, que o caráter punitivo é menor, ou seja, um ato ilícito, com aplicação de medidas administrativas e não mais criminais.
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Também não representa caminho livre para pequenos traficantes se "fantasiarem" de usuários e passarem a vender a droga sem ação da polícia. A decisão do STF não diz nada disso. Os policiais estão liberados a continuar com as abordagens e a realizar prisões nos casos de tráfico. Outro exemplo hipotético: uma pessoa flagrada com X porções de maconha, devidamente embaladas, com preço em cima, continua sendo indicativo de tráfico. O monitoramento policial deve e precisa permanecer. É o que a sociedade espera.
A decisão do Supremo é importante e vai reabrir uma importante discussão nos próximos meses. A reação no Congresso — formado, atualmente, por uma maioria conservadora — tende a ser forte. Se o texto aprovado na Câmara for o mesmo já votado pelo Senado, a PEC entra em vigor, com a criminalização da posse e do porte de qualquer quantidade de drogas ilícitas no país. Exatamente o oposto da decisão do STF.
Por isso, é fundamental o debate. É hora de uma participação efetiva da sociedade civil na construção de uma política nacional antidrogas, acompanhada de programa de redução de danos e de investimentos em educação preventiva, sendo fundamental superar visões preconceituosas e com soluções baseadas em evidências científicas e no respeito aos direitos humanos.