Cultura

A invisibilidade literária do DF: precisamos falar sobre isso

Não faltam autores e obras que transcendem fronteiras e idiomas e que merecem ser reconhecidos e celebrados

» Marcos Linhares*

"O que mata os nossos escritores é o silêncio, o esquecimento." Essa frase do publisher da Thesaurus Editora, o luso-brasileiro Victor Alegria, diz muito. Recentemente, confirmamos novamente isso: em recente matéria publicada pelo Portal G1 da Rede Globo, foram consultados professores de todo o Brasil para eleger qual seria o melhor livro publicado em cada estado. Lamentavelmente, o Distrito Federal não foi incluído na referida matéria.

Esse descuido evidencia uma tendência preocupante de marginalização da literatura produzida em Brasília, que merece reconhecimento e valorização tanto quanto qualquer outra unidade da Federação. O Distrito Federal tem uma rica e vibrante produção literária, sendo lar de escritores renomados que têm contribuído significativamente para a literatura nacional e internacional.

Dos nascidos em Brasília, um exemplo é Roger Mello, ganhador do prestigioso prêmio Hans Christian Andersen, considerado o Nobel da Literatura Infantil, concedido na Suécia. Além disso, temos  outros talentos como Paulliny Tort (Prêmio APCA de 2021), Marina Mara (Prêmio O Voo do 14 Bis,  Ministério da Educação e Ministério da Ciência e Tecnologia), Alexandre Pilati (Prêmio Machado de Assis de Contos, Sesc-DF) e Wélcio de Toledo.

Radicados no DF temos: Anderson Braga Horta (Prêmio Jabuti de Poesia, 2001), Cassiano Nunes (Prêmio Silvio Romero da Academia Brasileira de Letras), Maurício Gomyde (publicado em Portugal, Espanha, Itália, Alemanha e Lituânia),  Cibele Tenório (Prêmio Todavia de não Ficção 2023), José Rezende Jr. (Prêmio Jabuti de Contos e Crônicas, 2010), José Almeida Jr. (Prêmio Sesc, 2017), Custódia Wolney (Prêmio Oliveira Silveira, Fundação Cultural Palmares, 2015), Nurit Bensusan (Prêmio Jabuti,  Didático e paradidático, 2013), entre tantos outros autores.

Acerca de obras importantes para a cidade, entre mais antigas e recentes, destacam-se, entre outras: Bagana (de Ruy Carneiro, monólogo em três atos, primeiro livro impresso na nova Capital, em 1959); Luana (primeira ficção tendo a capital federal como cenário e personagem, de Garcia de Paiva, ambientado na cidade em construção, escrito em 1960 e lançado em 1962), Paralelo 16: Brasília (de José Geraldo Vieira), Lobo do Planalto (de Paulo Dantas),  Expresso Brasília — A história contada pelos candangos (de Edson Beú), Outono (de Lucília Garcez), Noites Simultâneas (de Maurício Melo Júnior), Pergunte à Pele (de Marcos Fabrício Lopes da Silva), Mayra e a Floresta Viva (de Adriana Kortlandt e Marcelo Capucci), O indizível sentido do amor (de Rosângela Vieira Rocha), Apague a luz se for chorar (de Fabiane Guimarães), Mulheres que mordem (de Beatriz Leal), Não vou mais lavar os pratos (de Cristiane Sobral), Clarice (de Paulo Souza), Três tigres tortas (de Tatiana Nascimento), Noites de Sol: o diário de uma quase adulta (de Bruno Bucis), Viúvas de sal (de Cinthia Kriemler), Risco Calculado (de Elaine Elesbão), Os possessos (de Leonardo Almeida Filho), Poemas de Paixões e Coisas Parecidas (de José Carlos Vieira), e a lista segue longa.

Não faltam autores e obras que transcendem fronteiras e idiomas e que merecem ser reconhecidos e celebrados. Ignorar a contribuição de nossos autores é desvalorizar a identidade cultural e literária do DF. Portanto, é crucial que veículos de comunicação de grande alcance, no processo de apuração do fazer literário nacional, possam reconhecer as realizações de prosa e poesia que acontecem no DF. Apenas assim poderemos garantir que a literatura brasileira seja apreciada na completude de sua diversidade e profundidade.

Faz-se necessário também ressaltar que entrou em vigor, em 10 de janeiro deste ano, a regulamentação da Lei de valorização da escritora e do escritor brasilienses e de incentivo à difusão de suas obras literárias (Lei nº 7.393/2024). A regulamentação dessa lei não é apenas um passo necessário, mas uma obrigação moral e cultural para assegurar que nossos escritores tenham o reconhecimento e o apoio que merecem. Sem eles, a indústria cultural do Distrito Federal estará fadada à estagnação e baseada na importação de ideias.

A literatura do DF não merece ser legada ao esquecimento. Finalizo com as palavras da saudosa Dad Squarisi sobre Brasília: "O horizonte sem fim me deu a certeza: quem tem esse infinito à frente não pode ter limites, é capaz de concretizar os sonhos mais grandiosos". 

* Escritor e jornalista, presidente do Sindicato dos Escritores do DF e do Instituto Fazer o Bem; membro do Fórum do Livro e da Leitura do DF.

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