Preservar a natureza é condição imprescindível para atenuar os efeitos que os fenômenos climáticos extremos têm causados aos humanos tanto no campo quanto nas cidades. Como enfrentar tamanho desafio não é preocupação exclusiva dos perímetros urbanos. Entre os dias 11 e 14 deste mês, líderes e integrantes de quilombos, de 18 países, reuniram-se em Bogotá, capital da Colômbia para formar a "Coalizão pelos Direitos Territoriais e Ambientais dos Povos Afrodescendentes da América Latina e Caribe".
Os quilombolas somam 21% da população total da região, ou seja, 1454 milhões de pessoas, cujos direitos têm sido negligenciados ou ignorados pelos diferentes governos de cada país. A tão decantada reparação aos descendentes dos negros sequestrados em África e escravizados na região ainda está longe de acontecer e, provavelmente, descartada nos planos dos governos desses países.
Imagina-se que a territorialidade dos afrodescendentes está apenas nas zonas rurais. Mas não é bem assim. Eles ocupam espaços tanto em regiões marítimas quanto em corpos hídricos no interior, onde há ecossistemas, em que a preservação tem enorme relevância para o enfrentamento das mudanças climáticas. Entre eles, estão os manguezais e recifes de corais, que os quilombolas preservam, por meio de práticas ancestrais, um dos legados de seus antepassados.
No Brasil, a população quilombola chega a 1,32 milhão de pessoas, ou 0,65% do total de brasileiros, segundo o Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística de 2022. A parcela está concentrada no Nordeste — 68,19% dos quilombolas do país ou 905,415 pessoas. Metade desse grupo (50,16%) está entre Maranhão e Bahia, que abriga a maioria, com 397.059 quilombolas, ou 29,9% da população recenseada. No Maranhão, tem 269.074 pessoas ou 20,26% dos afrodescendentes. Curiosamente, o Censo do IBGE não identificou quilombos no Acre nem em Roraima.
Na soma geral, quilombos ocupam 3,8 milhões de hectares, o que corresponde a 0,5% do território brasileiro. Hoje, foram identificadas cerca de 6 mil comunidades espalhadas em todo o país. Mas só 147 foram tituladas. Há 95,67% (1,27 milhão) de quilombolas sem títulos definitivos das terras que ocupam, ou seja, áreas que ainda não tiveram regularização fundiária. A Constituição de 1988, entretanto, havia estabelecido prazo para essa regularização, assim como o fez para as terras indígenas. Quilombolas e indígenas estão no mesmo barco da indiferença, capitaneados pelos sucessivos governos, e sob risco de ataques piratas daqueles que são francos adversários dos povos indígenas quanto dos povos negros. A secular relação amistosa desses povos com meio ambiente e seus saberes ancestrais não deveriam ser rejeitados quando o planeta se vê ameaçado pelas mudanças climáticas.