Juliane Lemos Blainski*
Muito se fala sobre inteligência artificial (IA) e como ela está cada vez mais frequente nas nossas vidas, da educação até o entretenimento. Para alguns, um perigo. Para outros, uma nova perspectiva de transformar o futuro. Para nós, "startupeiros" diretamente ligados à tecnologia rural, a IA é um divisor de águas que nos ajuda a mudar a realidade de muitas comunidades rurais vulneráveis.
O levantamento do Censo Agropecuário de 2017, último da série histórica, revela que a agricultura familiar no Brasil é a base da economia de 90% dos municípios brasileiros com até 20 mil habitantes. A pesquisa também apontou que 77% dos estabelecimentos agrícolas do país foram classificados como de agricultura familiar. Por essa relevância, digo que é no campo que a IA precisa estar!
E a capacitação tecnológica desse produtor rural familiar é essencial para que ele possa aproveitar os benefícios das novas tecnologias. Se adicionarmos o fator crise climática, a IA se torna fundamental, principalmente nas comunidades agrícolas vulneráveis, por não terem tantos recursos financeiros para passar por crises graves.
Imagine você ser um produtor familiar, de uma comunidade rural do interior do Amazonas, em um lugar que sofre com cheias e secas dos rios, que deverão se tornar mais intensas. Dentro da sua realidade humilde e pouco tecnológica, como você se prepararia para um advento climático extremo, seja de chuva, seca ou de pragas?
Eu respondo. É por meio de algoritmos de inteligência artificial, que deverão te ajudar com a análise de dados em tempo real para identificar padrões e prever problemas, permitindo a tomada de decisões mais informadas. Sem contar que os algoritmos de IA podem analisar dados históricos e climáticos para prever o rendimento das colheitas, ajudando a planejar melhor as atividades e a gerenciar riscos.
Hoje, as notícias sobre crise climática estão direcionadas para as tragédias do Rio Grande do Sul. Amanhã, será qual estado? Lá no Amazonas, já tem alerta de estiagem extrema que pode impactar a produção rural familiar. Para diminuir esses impactos, é preciso que políticas públicas estejam alinhadas com o desenvolvimento da população e a utilização de medidas urgentes, como levantar dados para prever perdas e, logo em seguida, sugerir soluções.
Muitos modelos de IA podem ajudar o produtor rural a planejar a rotação de culturas e o uso eficiente da terra, maximizar a produção e manter a saúde do solo. Além de ajudar a monitorar o impacto ambiental das práticas agrícolas e sugerir melhorias.
O uso da inteligência artificial dentro da produção rural funciona nas duas pontas: atua na mitigação de efeitos das crises para o produtor, mas também ajuda nas abordagens mais sustentáveis de manejo da terra e dos alimentos. Mas como é que um produtor rural familiar lá do interior do Amazonas poderá ter acesso a tal tecnologia?
Essa é a pergunta que devemos responder com ações! É a partir desse olhar sobre a escassez de recursos que transforma as comunidades rurais em lugares vulneráveis que precisamos nos debruçar. Pois vemos, claramente, a importância de abordar sobre esse esquecimento tecnológico — principalmente em relação aos agricultores familiares que são figuras indispensáveis nesse processo de preservação ambiental tão debatido.
A união do Poder Público com iniciativas privadas é necessária para trazer mais programas de treinamento e capacitação tecnológica, ampliando a compreensão sobre práticas agrícolas sustentáveis e mitigatórias, além de levar a implementação de redes de internet eficientes, pensadas para esses produtores vulneráveis. O não letramento tecnológico na agricultura familiar resulta em práticas ultrapassadas e ineficientes, dificultando a minimização de danos das crises climáticas.
*Mestre em agronomia pela Unioeste e doutora em biotecnologia e biociências pela UFSC. CEO da ManejeBem, startup que leva desenvolvimento para comunidades vulneráveis
Saiba Mais
Gostou da matéria? Escolha como acompanhar as principais notícias do Correio:
Dê a sua opinião! O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores pelo e-mail sredat.df@dabr.com.br