Cetamina

Visão do Correio: Mais eficiência no combate ao tráfico da cetamina

O efeito alucinógeno e o preço alto fizeram com que a droga caísse nas graças de traficantes — um problema que exige respostas urgentes e estratégicas de autoridades de segurança e vigilância

Traficante de cetamina -  (crédito: PCDF/Divulgação)
Traficante de cetamina - (crédito: PCDF/Divulgação)

Com forte poder anestésico, a cetamina foi imperativa na Guerra do Vietnã, em meados da década de 1970. A substância, sintetizada poucos anos antes, aliviava a assistência aos soldados americanos feridos no front. Desde então, espalhou-se pelo mundo para tratamentos de saúde — médicos e veterinários recorrem a ela em cirurgias — e para fins nada lícitos — é, por exemplo, uma das chamadas drogas do estrupo, que deixa a vítima desacordada logo após a ingestão. Nos últimos anos, ganhou força no Brasil outra destinação ilegal para a cetamina. O efeito alucinógeno e o preço alto fizeram com que a droga caísse nas graças de traficantes — um problema que exige respostas urgentes e estratégicas de autoridades de segurança e vigilância. 

Segundo levantamento da Polícia Federal, em dois anos, as apreensões mais que dobraram no país: de 2,45kg em 2022 para 4,5kg no ano seguinte. A maioria dos casos se concentra em São Paulo, mas os agentes consideram que há uma expansão do tráfico no Brasil — incluindo Amazonas, Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, Ceará, Paraná e Distrito Federal —, com a presença de redes interestaduais e internacionais de traficantes. 

A capital do país desponta como um possível elo forte desse esquema. Na última sexta-feira, policiais encontraram com um veterinário uma quantidade de cetamina suficiente para anestesiar 1,2 mil cavalos, e as apurações sugerem que a quantidade de droga distribuída pode ter sido o dobro da apreendida. Em dezembro, operação conjunta das polícias de São Paulo, do DF e do Rio de Janeiro apreendeu frascos para anestesiar 10 mil animais do mesmo porte. Investigadores trabalham com a hipótese de uma parte dos anestésicos vir ilegalmente da Argentina, da Holanda e do Canadá.

Casos recentes de prisão e morte sinalizam que o uso da cetamina no Brasil, até então comum em raves e outras baladas frequentadas por jovens, esteja começando a se tornar frequente em outros ambientes e entre públicos com mais idade. No fim do mês passado, Dilemar Cardoso Carlos da Silva, conhecida como ex-sinhazinha do Boi Garantido, foi encontrada morta dentro de casa, em Manaus. Investiga-se se a mulher de 32 anos tenha sofrido uma overdose de cetamina — ela fazia parte de uma seita religiosa que usava o entorpecente para alcançar plenitude espiritual.

No Brasil, o uso da cetamina só pode ocorrer com a presença de um profissional de saúde. E a compra também é exclusiva para quem atua na área. Diante de tamanhas restrições e da disparada dos volumes de droga apreendidos, não é exagerada a hipótese de que há falhas na fiscalização da aquisição, do uso e da circulação do medicamento no país. No caso da apreensão recente no DF, a clínica em que atuava o suspeito de tráfico não tinha registro no Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), que acompanha o uso veterinário do medicamento. 

O Mapa alega que faz fiscalizações de rotina em estabelecimentos e participa de operações especiais com autoridades policiais para coibir o tráfico. O aumento das apreensões no país pode ser consequência dessas operações. Considerando, porém, o poder bélico da cetamina e a crônica dificuldade brasileira em coibir a venda ilegal de medicamentos — como acontece com antibióticos e abortivos, por exemplo —, espera-se uma resposta mais robusta por parte dos governos federal e local.

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postado em 11/06/2024 06:00
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