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Artigo: Como ajudar o Rio Grande do Sul e muitos outros lugares?

Espero que esteja claro para todo mundo que tragédias como a que está ocorrendo no Rio Grande do Sul são resultados diretos das mudanças climáticas provocadas pelo homem

PRI-1006-OPINI -  (crédito: Maurenilson Freire)
PRI-1006-OPINI - (crédito: Maurenilson Freire)

*Eduardo Bessa

Apesar da tragédia que acomete o Rio Grande do Sul, há um aspecto positivo que podemos celebrar: a solidariedade que tem surgido na forma de voluntariado e doações. Pessoas de todo o país têm dedicado um pouco de seu tempo e seus recursos para tentar aliviar o sofrimento dos atingidos pelas enchentes no estado. Enche-me de esperanças ver essa propensão a ajudar e, por isso, gostaria de apresentar outras formas de apoiar os gaúchos e muitas outras pessoas, agora e no futuro.

Espero que esteja claro para todo mundo que tragédias como a que está ocorrendo no Rio Grande do Sul são resultados diretos das mudanças climáticas provocadas pelo homem. É certo que chuvas sempre ocorreram. No volume e com a frequência que têm ocorrido, porém, elas eram incomuns, mas estão se tornando cada vez mais corriqueiras. Da mesma forma que as chuvas, enchentes e desmoronamentos. Aqui, no bioma Cerrado, temos visto secas e incêndios mais intensos e frequentes. Eventos assim vão se tornar mais e mais usuais à medida que as mudanças climáticas se agravam, afetando cada vez mais pessoas.

Para evitar o foco no discurso do desespero e da desgraça, e aproveitando a inclinação das pessoas a ajudar neste momento, propomos uma reflexão sobre o que podemos fazer, a partir de agora, para amenizar as mudanças climáticas. É comum enxergarmos o papel dos governos federal, estadual e municipal no controle das mudanças climáticas, e ele será sempre fundamental. Definitivamente, não é o caso do "povo pelo povo" que se tem alardeado. Mas decisões individuais também podem ajudar muito. 

A forma como lidamos com os transportes, por exemplo, faz diferença. Há uma hype pelos veículos elétricos em curso, e eles, de fato, têm uma emissão 65% menor do que a de carros à combustão, segundo dados do International Council on Clean Transportation. Na nossa matriz energética baseada em hidrelétricas, um carro elétrico no Brasil emite 55g de gás carbônico por quilômetro rodado, enquanto, na matriz europeia, que usa mais termelétricas, são emitidos 92g. Apesar disso, a produção de novos carros elétricos emite muito carbono e eleva o consumo. 

Para evitar isso, podemos manter nossos carros flex e abastecê-los com álcool (106g de gás carbônico por km) contra 185g/km se abastecidos a gasolina. Dirigir de forma mais regular, sem acelerações e frenagens constantes e mantendo uma velocidade mais baixa também reduz o consumo de combustível. Melhor ainda é abrir mão do carro particular e utilizar o transporte público. De fato, qualquer forma de redução do consumo de energia, de carros menores e mais leves a banhos mais curtos ou frios, diminui as emissões em alguma medida.

Nossas decisões enquanto consumidores, como a ingestão de carne vermelha, é outro ponto que podemos repensar. Reduzir o consumo de 1kg de carne evita a emissão de 50kg de gás carbônico e 2kg de metano, que também contribui para as mudanças climáticas. Procurar produtores comprometidos com a causa ambiental, que não criem gado em áreas florestais e não pratiquem queimadas, por exemplo, é outra forma de contribuir. E não é só com a produção de carne bovina. Podemos preferir produtores que ofereçam uma forma de produção mais sustentável e com menor pegada de carbono.

Em nossas casas e quadras residenciais, também podemos trabalhar para reduzir as mudanças climáticas. Em vez de amplos gramados ou áreas calçadas, podemos ter mais árvores — que capturam mais carbono atmosférico — nos nossos quintais e áreas públicas da vizinhança. Devemos, ainda, privilegiar empreendimentos imobiliários e maneiras de construir que aproveitem áreas degradadas, como pastagens abandonadas, e não avancem sobre regiões preservadas do nosso Cerrado.

Questões grandes como as mudanças climáticas são intimidadoras e nos dão uma sensação imensa de impotência. É certamente mais fácil alcançar grandes impactos sobre nosso desafio climático por meio de políticas públicas do que por meio de ações individuais. Nesse ponto, é fundamental que aqueles que estão preocupados em ajudar o Rio Grande do Sul e muitas outras comunidades tenham como uma de suas atitudes escolher melhor nossos tomadores de decisão. Votar em políticos comprometidos com as questões ambientais é uma forma de evitar essas tragédias. 

No entanto, nossas microações de efeito local, se realizadas em conjunto — como temos visto acontecer com os voluntários e doadores da crise gaúcha —, terão um poder decisivo no estancamento da emergência climática. E dá para começar assim que você terminar de ler este texto.

*Professor do Programa de Pós-Graduação em Ecologia da Faculdade UnB Planaltina (FUP/UnB) e pesquisador da Rede Biota Cerrado

 


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postado em 10/06/2024 06:00 / atualizado em 10/06/2024 06:00
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