» Reginaldo Arcuri, Presidente-executivo do Grupo FarmaBrasil
As empresas nacionais enfrentam instabilidades constantes no que diz respeito às questões jurídicas no país, atrasando investimentos. No setor farmacêutico e farmoquímico, não é diferente. Vivemos, e não é de hoje, uma permanente incerteza jurídica. Há três anos, o Supremo Tribunal Federal (STF) estabeleceu que o prazo para a exclusividade de uma patente de medicamento é de 20 anos, independente do período de análise pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). Decisão assertiva, tomada para viabilizar a condução célere e eficiente dos processos administrativos, mas que não vem sendo respeitada na sua integralidade.
Desde o julgamento, são várias as ações judiciais que tentam, de alguma forma, inclusive sob a justificativa de atraso pelo INPI, prolongar a exclusividade da patente. Já foram mapeadas 59 ações no Judiciário, sendo três reclamações no Supremo Tribunal Federal (STF). Culpar o instituto para obter vantagens é um caminho que nenhuma empresa, nacional ou estrangeira, deveria seguir. Pelo contrário, nossos esforços devem se concentrar no fortalecimento do órgão, visando o que todos querem: a redução no prazo de análise de novas patentes.
É preciso apoiar, por exemplo, o projeto de lei que veda o contingenciamento dos recursos destinados ao INPI. Essa tem sido nossa batalha, trabalhar pela recomposição do seu orçamento, por entendermos ser a solução mais eficaz para dar robustez ao esforço dos profissionais. Não é só nossa, muitos também apoiam e reconhecem a importância dessa iniciativa, mas, infelizmente, existem outras frentes que atuam em movimentos contrários.
Exemplo disso são 10 projetos de lei que tramitam no Congresso para alterar a Lei de Propriedade Industrial e que acendem um sinal vermelho para uma conquista já alcançada. Colocando os pingos nos is, o que se pretende é restabelecer o debate sobre o prazo de exclusividade de patentes no Brasil, um confronto à decisão do STF. Não podemos permitir que haja retrocesso. Da forma como o rumo está seguindo no parlamento, estamos prestes a recriar um ambiente de insegurança jurídica às empresas nacionais e prejuízos à saúde pública. E mais, colocar em xeque os investimentos em pesquisa, inovação e desenvolvimento tecnológico.
Uma das iniciativas que avançam é um projeto que permite à empresa solicitar patente efetuar alterações no pedido até o requerimento do exame pelo INPI. Na prática, alguns laboratórios podem usar desse artifício para atrasar a análise pelo INPI e conseguir mais tempo de exclusividade na comercialização do medicamento para além dos 20 anos, comprometendo o sistema de patentes.
O prazo existe justamente para que os inventores possam vender o produto sem concorrência. E somos favoráveis à medida. O que não se pode aceitar são as artimanhas que tentam criar para estender esse tempo, inviabilizando a produção de genéricos e biossimilares e o lançamento no mercado a custos bem mais baixos. Perde o SUS, grande comprador de medicamentos, com o impacto bilionário no orçamento do Ministério da Saúde, que fica refém de apenas um fornecedor, e perde o próprio consumidor. Se hoje nossa balança comercial tem um deficit de mais de US$ 10 bilhões em medicamentos e a maior parte disso são de itens que correm o risco de ter extensão de patentes, o perigo de um arrefecimento maior é grande.
O setor é gigante, gera emprego e renda, investe em pesquisa e inovação. Para demonstrar a capacidade de inovação das empresas nacionais, recentemente tivemos pelo menos dois laboratórios, a Hypera e a Althaia, que captaram recursos da linha de inovação do Nova Indústria Brasil (NIB), junto ao BNDES, de mais de R$ 700 milhões para investimentos. A Biomm também está voltando a produzir insulina, atendendo e disponibilizando o medicamento à população que precisa. É a retomada da produção nacional, na linha com a missão da NIB.
Precisamos permanecer vigilantes, defendendo incansavelmente a continuidade do fortalecimento da política industrial, fundamental para expandir o acesso da população a tratamentos de saúde e com custo menor. Toda e qualquer medida que se mostre efetivamente capaz de contribuir para uma maior estruturação e eficiência da tramitação de patentes deve ser incentivada e apoiada com o objetivo final de se atingir um sistema nacional de propriedade intelectual robusto, equilibrado e eficaz. Contudo, mudanças que pretendem apenas produzir efeitos retrógrados na Lei de Propriedade Industrial trarão sérios riscos aos investimentos e avanços tecnológicos no país.
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