Ninguém pode ignorar a imediata, enérgica e eficiente ação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para apoiar o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, e os prefeitos da região no socorro aos atingidos pelas enchentes, mas o foco de suas ações deve ser objetivo quanto às necessidades da população e da economia gaúcha, e não aos eventuais. interesses eleitorais envolvidos.
O presidente Lula, prontamente, conseguiu aprovar uma lei no Congresso que suspendeu por três anos o pagamento da dívida do estado, num montante de R$ 23 bilhões. O auxílio emergencial de R$ 5,1 mil e outras medidas diretamente destinadas às famílias atingidas dispensam palavras para explicitar a preocupação efetiva do governo com os gaúchos flagelados. Ontem, o governo anunciou uma parcela extra do Fundo de Participação dos Municípios, no montante de R$ 192 milhões, para ajudar os prefeitos nessa emergência.
A criação de uma secretaria extraordinária, em nível ministerial, para controlar e agilizar os esforços federais era mesmo necessária. A nomeação para o cargo do ministro Paulo Pimenta, porém, foi polêmica; é vista como uma partidarização da atuação governamental. O que confirmará ou não essa interpretação será o comportamento do ministro extraordinário.
Numa democracia, toda ação administrativa tem impacto eleitoral, mas isso ocorre pelos seus resultados efetivos, e não em decorrência apenas do proselitismo ou da instrumentalização dessas ações. No caso das enchentes gaúchas, não será diferente. A politização do socorro aos gaúchos com propósitos eleitorais pode até ter um efeito bumerangue e se voltar contra seus autores, ainda mais em uma situação de destruição da envergadura que estamos presenciando. Até porque a plena recuperação do Rio Grande do Sul exigirá a atuação de vários governos e pode exigir o esforço de uma geração.
É importante destacar que a tragédia provocada pelas chuvas no Rio Grande Sul não tem precedentes, vai muito além das enchentes de 1941. Ela é reflexo de uma mudança significativa no regime de circulação das águas do Atlântico, provocada pelo aquecimento global. São mudanças que exigem um novo olhar dos governantes e o combate sistemático ao negacionismo ambiental.
Ou seja, requer políticas de Estado, continuadas, para ultrapassar a economia de carbono, defender as florestas e mudar o padrão de ocupação e construção das cidades. Segundo um artigo publicado em fevereiro na revista Science Advances, o braço atlântico da grande circulação oceânica que circunda os continentes está mais fraco devido ao derretimento da calota polar. Isso provoca anomalias no atual regime de chuvas e no padrão das temperaturas deste século.
O Hemisfério Norte ficará mais frio nas próximas décadas, em especial na América do Norte e no norte da Europa; e o Hemisfério Sul, mais quente. Há evidências científicas de que a Circulação de Revolvimento Meridional do Atlântico (Amoc), nome técnico do sistema, perdeu 15% de sua intensidade nas últimas duas décadas e se encontra, hoje, em seu momento mais fraco do milênio.
Essa circulação é importante para a manutenção do equilíbrio térmico do planeta. Observando as mudanças ao redor do paralelo 34,5° Sul, que passa pelo município de Chuí, no Rio Grande do Sul, e pela Cidade do Cabo, na África do Sul, o projeto captou indícios de mudança de temperatura em águas profundas na região. O Atlântico Sul está cerca de 1,6°C mais quente na faixa tropical e 1°C no restante. Pode parecer pouco, mas tem um impacto colossal: o aumento da velocidade e da potência dos ciclones e anticiclones, por exemplo. Ciclones extratropicais são geradores de tempestades. Por isso, as tempestades maiores e mais intensas no Sul, algumas no Sudeste, e as secas no Norte e Nordeste. E o aumento da temperatura das ondas e dos bolsões de calor, principalmente no centro do país.
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