Como se sabe, o governo federal resolveu empurrar a meta de zerar o deficit primário para 2025, descumprindo os compromissos anunciados para o terceiro mandato do presidente Lula no trato das contas públicas. A repercussão no mercado foi péssima, apesar de, há muito, analistas e agentes econômicos saberem das remotas chances de o Executivo fazer valer o denominado arcabouço fiscal. Objetivamente, a mudança na meta, além de gerar expectativas negativas em relação ao desempenho futuro da economia, trincou o cristal da credibilidade da equipe econômica e do próprio ministro Fernando Haddad.
O arcabouço fiscal aprovado pelo Congresso Nacional no ano passado estabeleceu duas diretrizes: respeito ao limite de despesas, que deve crescer anualmente a uma proporção de 70% da evolução das receitas no exercício anterior, respeitada a inflação oficial; e uma meta de resultado primário, com uma banda de tolerância de 0,25 ponto percentual para cima ou para baixo em relação ao PIB.
Ao projetar de deficit de 0,25% do PIB, mantendo a banda de tolerância, o deficit pode chegar a 0,50%, nas estimativas do mercado. Isso também coloca em xeque a meta de deficit zero anunciada para 2025. E todas as demais: para 2026, um superavit de 0,25%; em 2027, superávit de 0,5%; e, em 2028, de 1% do PIB.
É uma fuga para frente. Por isso mesmo, gera natural desconfiança dos agentes econômicos. Divulgado esta semana, o último relatório do Fundo Monetário Internacional (FMI) sobre políticas fiscais em todo o mundo serviu de alerta. O documento elevou a estimativa de deficit nas contas públicas brasileiras em 2024 de 0,2% para 0,6% do PIB. Elaborado antes de o governo afrouxar as metas dos próximos anos, o estudo mostra que é preciso um grande esforço para evitar o descontrole na dívida pública.
Entretanto, o governo Lula caminha — ou está sendo levado, a depender do ponto de vista — para abandonar a ancoragem fiscal da economia. De um lado, como disse a ministra Simone Tebet, as saídas para aumentar receitas estão se exaurindo. De outro, o Executivo não tem tido sucesso em reverter a tendência do Congresso a gastar mais e, simultaneamente, promover renúncias fiscais.
Não faltam temas espinhosos a tratar, ao mesmo tempo em que se acumulam pressões sobre o Orçamento. Desde o início da semana, dezenas de instituições de ensino federais - entre as quais as universidades do país - estão em greve. E as propostas apresentadas na Esplanada, até o momento, não surtiram efeito entre os servidores. Enquanto isso, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou proposta para beneficiar a elite do funcionalismo com a volta dos quinquênios, além de um reajuste salarial de 5% a cada cinco anos, automaticamente. Valor da conta: R$ 42 bilhões por ano.
Nesse contexto, seria possível manter a meta de deficit zero? Sem dúvida alguma, qualquer técnico competente em orçamento indicaria a urgência de se contingenciar gastos supérfluos ou ineficientes na administração federal, sem atingir as prioridades sociais. O problema é que o governo não parece preocupado com isso. E, assim, caminha o deficit público.
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