Visão do Correio

Visão do Correio: É preciso não repetir o passado na energia

Hoje, os descontos valem para os consumidores industriais, comerciais, dos setores de serviços e agronegócio, e deixa as despesas sobre clientes residenciais, as micro e pequenas empresas

A abertura do mercado de energia brasileiro, historicamente estruturado para um ambiente regulado, para o regime de contratação livre, trouxe ganhos para grandes consumidores, que reduziram o custo com um dos principais insumos, e para os investidores que apostaram nas novas fontes de energia. Hoje, o mercado livre de energia responde por mais de 40% da demanda de eletricidade do país, atendendo a apenas 40 mil consumidores, enquanto 89 milhões ainda estão no mercado regulado. Quem contrata energia no mercado livre não arca com todos os custos que recaem sobre o regulado, como taxas e contribuições para a universalização do atendimento dos brasileiros, fontes inovadoras e desenvolvimento do setor elétrico, incluindo a contratação de termelétricas, com custo maior de geração.

Esse quadro empurrou descontos para os consumidores industriais, comerciais e dos setores de serviços e agronegócio e deixou as despesas sobre os clientes residenciais e as micro e pequenas empresas. Quanto mais consumidores passarem para o mercado livre, maiores serão os custos sobre as tarifas do mercado regulado, onde não há a possibilidade de troca de fornecedor. O resultado dessa equação é o aumento na conta de luz sempre embutindo essa distorção. Esse é um problema que acendeu o alerta no governo federal, que tem propostas para baixar o custo da energia.

Há três opções apresentadas pelo Ministério de Minas e Energia. Antes de falar sobre as medidas é preciso fazer a ressalva que, no passado recente, a intromissão do governo no setor elétrico para baixar as tarifas deixou perdas para as empresas e não surtiu o efeito desejado no médio prazo. Em 2013, a então presidente Dilma Rousseff resolveu baixar a conta na caneta. Antecipou a renovação das concessões dos ativos das empresas de energia, que, em troca, reduziram a tarifa da eletricidade.

Naquele ano, a energia teve redução de 15,66%, mas no seguinte a seca esvaziou os reservatórios das hidrelétricas e obrigou o acionamento das termelétricas, pressionando o valor da energia. Resultado, de janeiro de 2014 a fevereiro de 2017, a tarifa de energia subiu 57,46%. Essa é uma lição que custou caro para os consumidores e para as empresas do setor elétrico — a Cemig, concessionária de energia de Minas, perdeu cerca de 50% da sua capacidade de geração por não aderir à renovação antecipada.

O governo está certo em buscar uma saída para esse quadro de custo maior para os consumidores do mercado regulado em detrimento de incentivos concedidos às fontes de energia que atendem ao mercado livre, mas é preciso que tenha cautela para não gerar uma solução de curto prazo, com impacto sobre as tarifas de forma conjuntural, e não estrutural e duradoura. Além disso, é preciso ser feito de forma a não encarecer a energia para os consumidores do mercado desregulado. Outro ponto que deve ser considerado é a previsão de abertura do mercado para que todos os consumidores tenham acesso à liberdade de escolher o fornecedor até 2030.

Na mesa do governo, estão a possibilidade de uso dos recursos dos leilões de petróleo da Pré-Sal Petróleo SA (PPSA), a equalização de custos entre o mercado livre e o mercado regulado e a utilização do Orçamento da União. Também está bem encaminhada a proposta de usar recursos da privatização da Eletrobras e dos programas de Pesquisa e Desenvolvimento e de Eficiência Energética da Aneel para a redução de custos na conta de luz. Há medidas em discussão e a redução no custo da energia é tudo o que se deseja, mas exige cautela para que não se repitam erros do passado.

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