"Gosto do Botafogo. Não há na Terra clube mais dostoievskiano"
Utilizo uma frase clássica do jornalista e dramaturgo Nelson Rodrigues porque vejo de forma positiva o início da CPI da Manipulação de Jogos e Apostas Esportivas, que começou para valer nesta semana no Senado. E o primeiro a prestar depoimento foi justamente o empresário John Textor, dono do Botafogo, e maior crítico da atualidade da arbitragem no futebol brasileiro.
Como era de se esperar, com o clubismo aflorado, torcedores rivais trataram de tentar desqualificar as palavras ditas por Textor. O discurso do cartola, no entanto, precisa ser respeitado. Primeiro porque o Brasil vive um momento extrema relevância: o de expansão das apostas esportivas. É um mercado bilionário que, se não for devidamente fiscalizado, pode se tornar um terreno fértil para o crime. Se pegarmos a milícia, por exemplo, que se instalou no poder público do Rio de Janeiro, por que, então, a maior paixão do brasileiro estaria imune aos malfeitos?
Dessa forma, a CPI assume um papel fundamental na defesa da integridade do futebol. Em sessão secreta com os senadores, Textor apresentou informações reservadas que precisam ser apuradas com rigor e imparcialidade. Denúncias essas que foram feitas anteriormente à CBF e ao Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) e que acabaram arquivadas em uma canetada. Não soa estranho? Mesmo que sejam questionadas por alguns, não era o caso de se encaminhar ao Ministério Público ou à Polícia Federal para uma apuração mais aprofundada?
Antes de se fazer chacota com o Textor, em tom jocoso sobre a perda do Campeonato Brasileiro do ano passado, é fundamental que se investigue e convoque árbitros, jogadores e dirigentes sob suspeita. Se nada for provado, ok. Mas é fundamental dar voz a todos. Deputados e senadores repetem a todo instante que "sabe-se como começa uma CPI, mas nunca como termina". Depoimentos como o de Pedro Collor (caso PC Farias), do caseiro Francenildo (Bingos) ou de Duda Mendonça (Mensalão) não estavam previstos no início das investigações no Congresso, mas acabaram se tornando símbolos de CPIs.
Por isso, mesmo sendo um palco político, vejo que a CPI do Senado poderá servir para melhorar o futebol brasileiro. Torná-lo mais justo e transparente. E quem sabe avançar sobre um tema que fica à margem do debate: a profissionalização da arbitragem. Se os juízes e auxiliares que atuam no VAR desempenham um papel fundamental nas partidas, por que não dar qualificação, remuneração e respeito profissional tal qual um jogador ou um treinador?
Ninguém deve temer ou criticar uma CPI antecipadamente. A não ser que tenha culpa no cartório ou medo de saber a verdade.
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